Negro, muçulmano e comunista

Desde criança, sou fascinado pelos filmes estadunidenses de faroeste, os “westerns”. E o fascínio continua. Sem explicar ou entender o porquê, sempre torci para os índios e, muitas vezes, para que os bandidos vencessem os mocinhos. Com exceção, é óbvio, de John Wayne e Gary Cooper, meus ídolos. A saga da conquista do Oeste ainda é apaixonante, mesmo quando romanceada e enfeitada.

Ainda na juventude, comecei a perceber que, nos “westerns”, se narrava grande parte da história dos Estados Unidos e, em especial, a formação do perfil e do caráter de seu povo. O uso de armas – como se fossem parte da pele de mocinhos e bandidos – se tornou uma cultura transmitida de geração a geração. E John Wayne é bem o símbolo do machismo gringo, ainda vivo e manifestado no modo de vida do povo. Um estadunidense sem revólver ou fuzil parece sentir-se nu. Cada um é um mocinho e bandidos são o resto do mundo.

No mínimo, no mínimo – em meu entender – é um povo esquisito, mas realizador de grandes feitos, de mudanças formidáveis na sociedade humana. Pena que, como nos filmes, o país queira ser o xerife do mundo. E, apesar de estar capengando, ainda é. Matar parece tão natural que se assemelha, de certa maneira, a um divertimento. E o radicalismo – praticamente em todos os setores da vida – impressiona por sua virulência. Na religião, na política, nas diferenças étnicas, na prepotência em relação aos outros povos, na arrogância de pretender impor a “pax americana” a qualquer preço e a qualquer custo.

A vitória de Barack Obama, reelegendo-se de maneira mais folgada do que se esperava, não deixa, também, de ser uma esquisitice. Ora, a diferença entre ele e o outro concorrente, Mitt Romney, era semelhante a água e vinho. Certamente, o mundo estaria em perigo – em mais perigo – se Romney e os malucos radicais do Partido Republicano retomassem o poder. Com Obama, há rasgos de humanismo – ainda que à EUA – que permitem expectativas melhores, em especial num segundo mandato, agora com mais experiência e sem o peso de disputar uma outra eleição.

O que nós, brasileiros, temos a ver com isso? Lembro-me de que, nas últimas eleições municipais, um candidato a vereador me pediu que o orientasse para iniciar a sua vida político-partidária. Por onde começar, o que fazer? Respondi-lhe que deveria começar a tentar entender política internacional. Pois até o buraco no asfalto da sua rua dependia das oscilações políticas internacionais. E assim é, agora cada vez mais clara e intensamente. Eleições municipais, pois, são secundárias em diante dos efeitos das variáveis nas relações internacionais.

De uma certa maneira, Obama é essa garantia de equilíbrio, de bom senso, de um imperador esclarecido e sensível. Quando se vêem grandes núcleos oposicionistas renegarem-no, chamando-o de “negro, muçulmano e comunista”, não podemos deixar de nos remeter aos filmes de faroeste. Para os radicais republicanos, xerifes e mocinhos, Obama é o bandido a ser fuzilado. Ou o índio a ser banido. Que se façam figas e que se bata três vezes na madeira para não se repetir, em Obama, a tragédia dos Kennedy e de Luther King. Bom dia.

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