A capela de Santa Cruz, das festanças dos negros

O texto abaixo foi publicado em outubro de 1987 no semanário impresso A Província. Recuperamos para lembrar os 30 anos de atuação em Piracicaba.

 

capela-santa-cruz-1

Capela de Santa Cruz do Mato

A capela de Santa Cruz ficava no largo do mesmo nome. Compreendido pelo retângulo das ruas Moraes Barros e São José e as laterais daquela.

No meio havia a capela, um prédio só, com altar e bancos. No exterior era tudo capim, porque chão de terra.

Em torno às calçadinhas depositavam-se velas, como cumprimento de promessas.

De vez em quando a gente via um ou outro ex-voto.

Por ocasião da efeméride de Santa Cruz, espalhavam-se barraquinhas de prendas pelo local. Não faltavam os bambus e bandeirolas coloridas.

Havia dois leiloeiros. Um era “negrarrão”, beiços de arroba, peso-jamanta. Chamava-se Maurício. Como não sabia impostar a voz, urrava nos pregões.

O que mais me marcou foi o samba rural caipira, liderado por Januária e João Joana.

Januária morou até a morte à Rua da Glória, em frente ao João Tino Furlano. Era doceira de profissão. João Joana morava na Vila Rezende. Foi cortador de cana-de-açúcar. Bebia muito. Foi pai da Cacilda, que samba e batuca. João Joana tocava o tambu na umbigada (batuque).

A capela nas festanças pertencia ao negro, que enchia o páteo e animava os outros sambas: o de desafio, o de roda, o de lenço.

Com o término da construção da Igreja do Bom Jesus do Monte (1935) a capela perdeu a sua vez. No governo de Ricardo Ferraz de Arruda (1939-1940) (+), a rua (Santa Cruz), foi calçada com paralelepípedos. E fêz-se a travessa à esquerda da porta de entrada daquela, a qual dava para a Rua Moraes Barros.

Construiu-se, também, o passeio, com bancos e árvores espaçadas. Imediatamente iniciou-se a feira livre, que hoje se dá às terças-feiras.

No governo de José Vizioli (1941-1943) (+), ele mandou erguer um cruzeiro que foi transferido e que se encontra ao lado da igreja da Vila Boyes, que monsenhor José Nardin denominou São Dimas, bem como, com o mesmo nome, o referido bairro.

A peça em granito negro, todo apicoado, foi trabalho orientado pelo escultor João Baptista Ferri (+), que tinha o atelier no Largo do Pari, em São Paulo.

Um inimigo de José Vizioli, aquele mesmo que soltou no Jardim Central um galo sem uma perna, porque o prefeito acima era “aleijado” na perna direita, botava résteas de cebolas na escultura e passou a chamá-la “cebolão”.

Daí a sua transferência para a área, onde se construiria a igreja de Vila Boyes. No lugar da cruz, no largo, fez-se uma de tijolos rebocados, sem nenhuma beleza e valor artístico.

capela-santa-cruz

“Batuqueira” Januária

Deixe uma resposta