1950, 1970, 2014

Vaia à SeleçãoNão fui presenteado por Deus apenas com o privilégio de – como espectador, observador, até mesmo como ator – pertencer a tantas décadas de acontecimentos revolucionários no mundo. Além disso, fui privilegiado com uma memória que a mim mesmo muitas vezes me espanta. Se, desde muito pequeno, vi tantas coisas acontecerem, o mais importante foi tê-las guardado, quase todas, na memória. Não se trata de orgulho ou vaidade tolas, mas de agradecimento por um dom que me foi dado gratuitamente.

Lembro-me de coisas de meus dois, três anos de idade, conseguindo traduzi-las, muitas delas, em minúcias. Por isso, em 1950 – nos meus poucos 10 anos de idade – vivi a Copa do Mundo no Brasil em toda a sua extensão, orientado por meu pai, ouvindo os jogos por rádio com ele, já lendo jornais, ouvindo comentários. Recordo-me com nitidez da exploração política que a eterna e medíocre oposição política – então já encarnada pela UDN – fazia à Copa do Mundo, desmoralizando o Selecionado e protestando contra a construção do Maracanã. Berrava-se histericamente contra o então prefeito do Rio de Janeiro, então antigo Distrito Federal,  Marechal Mendes de Morais, pela feitura da obra que era conhecida como “o maior estádio de futebol do mundo”. Era e foi, para desespero da oposição. E as denúncias de corrupção atingiam figuras polêmicas, como Adhemar de Barros – governador do São Paulo – e Moisés Lupion, governador do Paraná.

Pouco antes, porém, do início dos jogos, a maré de protesto se transformou num maremoto de civismo, de paixão, de união nacional em favor da Seleção Brasileira, na qual despontavam líderes do naipe de Ademir de Menezes, de Zizinho, de Bauer. A derrota para o Uruguai, no jogo final, abalou o Brasill, que ficou em luto coletivo e todas as coisas se deixaram molhar por lágrimas que escorriam de Norte a Sul.

Em 1970, então na ditadura militar, a cegueira da oposição – sempre incapaz de diferenciar governo de país, políticos de povo – passou a pregar uma campanha raivosa e odiosa para que o povo brasileiro torcesse contra a sua Seleção, aquela de Pelé, Tostão, Gerson, Rivelino. Foi uma campanha sórdida, de politicagem rasteira: desejava-se a derrota do Brasil acreditando que, assim, a ditadura militar seria abalada. Estávamos nos tempos do “Prá frente, Brasil”, “Brasil, Ame-o ou Deixe-o” A ditadura era, sim, cruel e o crescimento do país parecia triunfante. Mas era preciso, em nome da política, que a seleção Brasileira fosse massacrada, desmoralizada. As esquerdas – sempre radicais e ingênuas, ainda que não tão estúpidas quanto a direita – pregava o pior. Mas, ao iniciar-se a Copa do México, lá estava todo o país de mãos dadas, de pulmões pulsantes, congraçado em torno do altar do futebol, nosso centro de unidade nacional. E a vitória brasileira reacendeu as esperanças do brasileiro.

Agora, estamos em 2014 e prestes a realizar um dos grandes e maiores sonhos nacionais: sediar, novamente, uma Copa do Mundo, até mesmo para nos redimirmos do fracasso de 1950, amargor que nos acompanha até hoje. Quem se esqueceu de quando foi anunciado que o Brasil sediaria a Copa/2014? Multidões saíram às ruas, a alegria dominou a nação, o orgulho foi elevado a níveis de quase sonho. E a felicidade da nação se acentuou anda mais quando, além da Copa do Mundo, o Rio de Janeiro foi escolhido para sediar as Olimpíadas de 2015! Foi um êxtase coletivo, a morte definitiva do “complexo de vira-lata” a que se referia Nelson Rodrigues. O Brasil era, finalmente, reconhecido como uma grande nação.  Tornávamo-mos “gente grande”.

Mas a miséria política mantém-se viva. As oposições estúpidas avivam campanhas derrotistas, convocam e convidam às arruaças, mesmo com o risco de o mundo nos enxergar como um povo realmente inferior. Repete-se, com as obras para a Copa do Mundo, o mesmo que ocorreu durante a construção do Maracanã. E a denúncia de suspeitas de corrupção é a mesma, como se fosse um mantra. Qual outra bandeira as oposições têm senão falar em corrupção? E, quando chegam ao poder, o que fazem, senão mamar nas mesmas tetas? “Mudam-se as moscas, não muda o monte…”

Torcer para o fracasso da Copa do Mundo revela, antes de mais nada, estupidez, burrice e oportunismo de miséria política. É um propósito infrutífero, pois mesmo antes de a bola rolar, o povo brasileiro estará enrolado nas bandeiras nacionais, com camisas da Seleção e o brado heróico, retumbante: “Brasil, Brasil.” Se viermos a perder – e oxa, Satanás! – a história será outra. Uma derrota do Brasil será a vitória dos miseráveis. E o mundo todo pensará ser, essa pequenez, da natureza do brasileiro. Mas não é. Somos maiores e melhores do que essa caterva.  Nunca, como agora, talvez venha a calhar um grito agora de indignação: “Bandidos, amem o Brasil ou deixem-no!” Bom dia.

1 comentário

  1. Jairo Teixeira Mendes Abrahão em 12/02/2014 às 12:44

    Bom dia! Amigo querido!
    Assim como você “vi” a Copa de 50 pelo radio. Jorge Cury, Antonio Cordeiro e outros da Radio Nacional, claro, nos descreviam as jogadas, e com imaginação conseguíamos “ver” os jogos!
    Amigo Cecilio, como nos ilumina sua lucidez! Belíssimo depoimento sobre o momento político!
    Excelente dia para você!

    Jairo.

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