A mulher justa de Brasília

Dia chegará quando, em vez de procurarmos apenas o que é santo nos livros sagrados, descobriremos que, mais do que santos, são livros de sabedoria. Desde a herança upanishad, dos pensadores orientais, dos livros bíblicos, do islamismo, do judaísmo, todos os livros acabam por reunir a ancestral sabedoria humana a partir de um aprendizado de dores, de sofrimentos, de amarguras.

Sem forçar a imagem, Brasília pode ser considerada, hoje, a Sodoma e Gomorra do Brasil, lugar de todas as perversões, de indecências, de indignidades. A desfaçatez da classe política brasileira brada aos céus, sendo de se temer, com razões cada vez mais graves, a reação do povo através não mais de ações políticas, mas de força. Até Deus perdeu a paciência com Sodoma e Gomorra, ouvindo, como está no Gênesis, o clamor vindo até mesmo de suas pedras. O patriarca Abraão pediu clemência, inconformado pelo que lhe parecia injustiça de Deus, punindo pecadores e inocentes ao mesmo tempo. Estão nos livros, a dor de Abrão, a cólera de Deus e também sua complacência: se houvesse 10 justos em Sodoma e Gomorra, ele não as destruiria.

Brasília está sendo destruída aceleradamente, não em sua dimensão física, mas moral. Não se pode mais respeitar a Brasília dos políticos, a Brasília dos partidos, a Brasília dos governantes. No entanto, há um povo que mantém a sua dignidade, lutando para sobreviver, formando famílias com decência e criando filhos com hombridade. Será esse povo, o brasiliense, que encontrará clemência por parte de um Brasil justo e honesto, que ainda existe. A Sodoma e a Gomorra políticas estão em vias de ser destruídas pela erupção da desesperança popular e, também, dos movimentos democráticos que pregam, aceleradamente, a campanha para não mais se votar em quem quer que seja que desempenhe ou tenha desempenhado cargo político. E se houver dez políticos justos? – poderá Abraão perguntar à cólera popular.

Se há políticos justos e decentes, já não mais se sabe, pois a canalhice despudorada desse José Roberto Arruda, um verdadeiro marginal no governo de Brasília, impede qualquer análise otimista ou apenas generosa. Arruda montou uma quadrilha com esse partido farisaico, o DEM, que não consegue disfarçar o seu DNA de PFL. São os sepulcros caiados de que falam os livros, a raça de víboras. Eles contaminam tudo, vírus que provocou uma pandemia de corrupção e desordem no país.

No entanto, Brasília será salva da cólera universal pois apresentou, ao mundo, uma admirável mulher justa, humilde, decente, íntegra, de honestidade que se torna também contagiosa como a brisa refrescante que passa e redime. Dona Creuza, o nome dela, a pobre passadeira de roupas que – na Sodoma e Gomorra do Brasil – encontrou um envelope com 4.500 reais, equivalente a três meses dos vencimentos de sua família. Dona Creuza não escondeu o dinheiro na calcinha, nem na cueca do marido, nem nas meias de ninguém, nem alegou ter sido fruto da venda de panetones. A mulher justa de Brasília chamou a Polícia e entregou o dinheiro: “no que não é meu não mexo.”

Políticos vagabundos deveriam estar envergonhados diante da dignidade de dona Creuza, a doméstica que, num mar de lama, expõe a beleza moral do ser humano. Mas não, eles não irão se envergonhar. Porque, na verdade, vagabundos não têm capacidade de sentir vergonha. A Brasília de dona Creuza está salva. Mas a Brasília dos políticos, essa será transformada em sal, talvez como a mulher de Ló. As próximas eleições deverão confirmá-lo. Bom dia.

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