Ainda existe sociedade?

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Os homens são feitos para viver em sociedade. Se Deus tivesse querido que cada homem pudesse viver sozinho e afastado dos outros, teria dado a cada um qualidades próprias e suficientes para viver em solidão: se não seguiu este caminho, é porque quis que os liames de sangue de proveniência formassem entre os homens uma união cada vez maios forte. A maior parte das faculdades do homem, as suas inclinações naturais, as suas fraquezas, as suas necessidades são provas certas desta intenção do Criador. A natureza e a constituição do homem, com efeito, são tais que, fora da sociedade, ele não saberia conservar a vida, em desenvolver e aperfeiçoar as suas faculdades e os seu talentos, nem procurar para si uma verdadeira e sólida felicidade.

Porquanto a sociedade é necessária aos homens, Deus previu qualidades e talentos que nos tornam idôneos para viver nesse estado: a faculdade da palavra, por exemplo, nos dá a possibilidade de comunicar os nossos pensamentos com facilidade e presteza e, de resto, fora da sociedade não nos seria de qualquer utilidade. Correspondem à mesma função a nossa propensão à imitação e todos os maravilhosos mecanismos que nos permitem comunicar com facilidade as paixões e perturbações da alma. É suficiente que uçm homem pareça emocionado para nos comover e enternecer. Se alguém se aproxima de nós com alegria estampada no rosto, suscita em nós igual sentimento de alegria. As lágrimas de um desconhecido nos tocam, antes ainda de lhes conhecermos a causa, e os gritos de um homem nos fazem correr para socorrê-lo como um mecanismo que precede toda deliberação. E não é tudo. A natureza quis subdividir e distribuir os talentos entre os homens de maneira desigual, dando a alguns atitudes que a outros parecem impossíveis, enquanto estes últimos têm capacidades que foram negadas aos primeiros. Assim, se as necessidades naturais dos homens os fazem depender uns dos outros, a diversidade de talentos torna-os capazes de ajudar reciprocamente, liga-os, une-os.

Assim, tudo nos guia para a vida em sociedade; a necessidade a torna indispensável, as nossas inclinações naturais fazem com que ela se torne um prazer e o estado de espírito com que nos colocamos em direção a ela nos mostra que, com efeito, ela é o fruto da vontade do nosso Criador. Se o cristianismo santifica os solitários, a caridade e a justiça, ainda assim, constituem leis e dão forma ao relacionamento com o próximo.

Toda a economia da sociedade humana está fundada neste princípio geral e simples: “Quero ser feliz, mas vivo com homens que, como eu, querem, por sua vez, ser felizes. Procuramos um modo de buscar a nossa felicidade suscitando-a também nos outros, ou pelo menos sem nunca fazer mal aos outros.” Estas duas inclinações, se bem que distintas uma da outra, nada têm de contraditório, foi Deus que as pôs em nós, destinou-as a agir de acordo, para nos permitir ajudar-nos entre nós e não nos destruirmos.

Este é o fundamento da sabedoria humana, a força de todas as virtudes puramente naturais e o princípio geral de toda a moral e de toda sociedade civil, sociedade que se mostra regulada por alguns princípios fundamentais: o bem comum, o espírito de socialização como princípio universal, a igualdade natural entre os homens, o respeito aos liames sociais.

OBS – Tal texto não é de minha autoria. Propositalmente, deixei-o sem as aspas necessárias. Esta é a visão dos criadores da “Encylopédie Française”, iniciada em 1745, tendo como principais pensadores Diderot e d´Alembert.  Mais de 250 anos depois, deveríamos nos perguntar: construímos ou destruímos essa sociedade humana?

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