Cansativa luta contra anões

O texto foi publicado no dia 24 de agosto de 1982 em O Diario e depois selecionando para o livro Bom Dia – Crônicas de Autoexílio e Prisão, lançado em 2014

Perguntam-me, alguns, se não me cansei. Não, não estou cansado. Mas há um cansaço diferente, daqueles que me fazem sentir a inutilidade de certas posições, atitudes, lutas. Esse eu tenho muitas vezes, mas supero-o. Tenho confessado, aliás, que minha disposição para a luta e o entregar-me a campanhas em que sou agredido e agrido, essas nada mais são do que a defesa do meu mundo pequenino, o íntimo, o familiar. Ele é bonito demais para que eu não o preserve e ao mesmo tempo tente pelo menos leva-lo ao mundo maior em que todos vivemos, também os meus queridos e eu.

Todo homem tem seu núcleo interior belo e intocável que – no mais fundo de si mesmo – gostaria de dividir com os outros ou soma-lo aos que também preservam os seus. Ocorre, no entanto, que cada um guarda, para si mesmo, aquilo de bom, de belo e de puro que carrega consigo. Não repartimos as nossas alegrias e nem mesmo angústias como se fossem apenas nossas e guardando-as egoisticamente. Não creio nisso, pois acredito na vocação humana para o convívio e a comunhão. Por isso, quando me atiro à luta, não é o guerreiro que comanda, mas o homem que ama a paz e que busca a harmonia a partir de si próprio. “Se queres a paz, prepara-te para a guerra”, diziam os romanos. E o homem tornado Messias. “Não te trago a paz, mas a espada”. Morrerei acredito nisso.

Por isso, não me perguntem se cansei, se passei a acreditar que a luta não compensa ou se estou procurando apenas minha paz interior e familiar. Não é nada disso. A luta é mais árdua e mais áspera do que eu supunha. É luta que precisa ser enfrentada em nível estrutural, muito mais exaustiva, portanto, do que a travada contra políticos despreparados ou administradores imorais. É fundamental que eles não mais cheguem ao poder. Logo a questão é estrutural e não de conjunturas.

Ora, o tempo que gastei e perdi conta prefeitozinhos e vereadorezinhos, contra autoridadezinhas, eu o deveria ter usado para gastar energias com o essencial. E, para mim, seria uma luta para criarmos uma consciência de tal forma ampla em relação aos nossos direitos que impedisse espaço aos medíocres e mal-intencionados. Governos e governantes não são e não podem ser proprietários da dignidade e dos direitos humanos. E, desgraçadamente, têm sido.

Os grandes ideais têm que ser centrados nos objetivos mais nobres e altos. Por que perder tempo com um simples Promotor Público – que se considera o ditador-mor – e a farsa está no próprio Ministério Público, subordinado e submisso às algemas de Brasília? Como e por que lutar contra classes dirigentes, se o país permite que pessoas medíocres e de má fé cheguem a postos e cargos nos quais se exige muito mais do que um simples diploma, um simples concurso, ou uma singela indicação de padrinhos? A minha, a partir desse recolhimento forçado, se tornou uma revisão estratégica, não um cansaço de batalhas. Admito, enfim, ter entrado em guerras equivocadas. E me feri. Tolamente, pensei estar lutando contra gigantes. Mas eram apenas anões. Bom dia.

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