Deliciosos céus de Maomé

picture (92)As promessas das religiões abrahâmicas – judaica, cristã, muçulmana – são irresistíveis. Os céus que oferecem despertam os mais embriagadores desejos. Há delícias e paz e amores e deslumbramentos de tal forma sedutores e inebriantes que não há ser humano inteligente capaz de resistir à vontade de ser bonzinho e ir para o céu. Se se acreditar em tais maravilhas, o mundo não tem qualquer importância. Aqui é chato. Lá, nos céus prometidos, o gozo é infinito. E sem mais problemas.

De minha parte, estou contente com os benefícios imediatos dos deuses pagãos. Dioniso e Eros são deuses deliciosos. Como não sou pretensioso, eles me bastam. Pelo visto, porém, o mundo é feito de gente ambiciosa, mais egoísta, gente insaciável, desejosa de prazeres e de felicidade eternos. De tanto querer, não percebem o que já tem nesta terra e neste tempo. Quem não sabe se divertir por aqui acaba querendo se divertir por lá. Fica bonzinho para merecer o outro céu.

O que estranho é a obsessão em torno de céus feitos de mulheres virgens. Nos grandes livros religiosos, lá está a figura misteriosa das mulheres virgens, promessas de delícias. A Virgem, em todas as culturas – desde a mais primitiva – simboliza o mistério. A virgindade é aquilo que ainda não foi revelado, o que não se manifestou. Se a alma ainda está vazia, é virgem. Mas aquilo que é virgem permanece estéril enquanto não for fecundado. Quem fica virgem a vida toda não produz fruto algum. Fecundar, romper virgindade, eis a chama erótica que desperta o macho das espécies. Quantos crimes não se cometeram por causa de um hímen? Até os evangelhos falam de virgens, das dez virgens, aguardando o noivo com suas lanternas e azeites… Imagine-se, então, como não haverá loucuras sem fim para se merecer um céu com dezenas de virgens para cada fiel.

O fato é que os céus prometidos são maravilhosos, imperdíveis. E os descritos por Maomé são, dos que eu já li, os mais espetaculares, céus edênicos, erotizados, céus feitos de delícias sem fim, delicias para a carne e para a alma – diferentes de alguns céus chatos que deleitam apenas o espírito. O que há de virgens prometidas nos céus de Maomé tira o fôlego de qualquer um. O santo guerreiro que morrer pelo Islã terá direito a cerca de 100 virgens no Paraíso. E com um detalhe formidável: depois de cada noite de amor – ou dia, sei lá eu – a virgem volta a ser virgem. O que, convenhamos, dá uma trabalheira danada, mas isso não é para se falar agora, ai que tristeza!

Os céus descritos por Maomé são, portanto, irresistíveis. E basta imaginar o que significam para povos pobres, sofridos, lutando contra o deserto, contra a fome, povos muitas vezes em andrajos – mas com almas poéticas, como milenarmente poética é a alma oriental. No árabe e em outras línguas do Islã, a imagética literária é deslumbrante, como a dos hebreus. O cântico hebraico de Salomão como que inspira a linguagem de Maomé. As relações com o amor e com Deus, no Islã, se manifestam de maneira lírica: a amada e o amado são como que gotas d´água no oceano divino, como o rouxinol que busca a rosa. E, assim, também os céus prometidos. Está lá no Alcorão, uma descrição do Paraíso prometido aos fiéis:

“Rios de água incorruptível, rios de leite de sabor inalterável. rios de vinho deleitante para os que bem. e rios de mel purificado.” E mais: “Jardins das delícias, beldades que jamais foram tocadas por homens ou gênios, reclinadas em coxins cobertos com pano verde e formosas almofadas.” E o homem e a sua amada serão servidos “no jardim das delícias, sobre leitos forrados de linho”, servidos por “efebos imortais, com taças, jarras e ânforas cheias de néctares provindos dos mananciais celestes”. E, enfim, os eleitos “passearão entre lotos sem espinhos, e pomares com árvores frutíferas, entrelaçadas, em densa sombra, água manante, frutas abundantes, inesgotáveis, que jamais lhes serão proibidas.” E, para eles, serão criadas novas criaturas: “e as fizemos virgens, amantíssimas, amigáveis, afaváveis.” Por toda a eternidade.

Não dá água na boca? O Bin Laden sabe o que está oferecendo aos infelizes e andrajosos afegãos. Para derrotá-lo, o Ocidente terá que fazer oferta melhor. A do FMI não dá. Bom dia.

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