E Tiririca leu e escreveu

Tiririca 2Há coisas – muitas, aliás – que não consigo entender. Pergunto-me, por exemplo, por que um adolescente de 16 anos tem direito ao voto e, ao mesmo tempo, não pode ser preso diante de crimes cometidos. A resposta que me dou, por falta de outras, é que o motivo seria o de, no Brasil, o ato de votar não ter lá grande importância. Votar-se-ia, então, por experiência, por treinamento. Fôssemos sérios, o mesmo garoto que vota no Presidente da República teria condições totais de ser penalizado por crimes cometidos, como um adulto. Pois não há adultos apenas de ocasião.

Outra coisa que não entendo: por que um analfabeto tem o direito de votar e não pode ser votado? Se, a um cidadão sem qualquer base escolar, foi reconhecido o direito de escolher seus representantes e governantes – incluindo o Presidente da República – por que, então, lhe é negado o direito de se candidatar, de ser ou não escolhido pelos eleitores? Se pode escolher, por que não pode ser escolhido?

As estatísticas são aterradoras: quase 80% dos alunos que saem dos cursos escolares básicos são analfabetos funcionais. Foram à escola, nada aprenderam, muitos deles – por não serem reprovados ou exigidos – chegando até mesmo a muitas das faculdades apenas mercantilistas que temos por aí. Analfabetos funcionais, se enveredam pelo crime, quase sempre são delinquentes de causas menores, pequenos traficantes, ladrões de galinhas e de residências, assaltantes de esquinas. Os maiores bandidos que o Brasil conheceu e conhece estão no alto da pirâmide: grandes empresários, políticos de renome, banqueiros que dão golpes biliardários. Muitos deles têm diploma de curso superior. Veja-se o José Roberto Arruda, ex-governador do Distrito Federal: é engenheiro formado. Como Paulo Maluf, por exemplo. E Fernando Collor, advogado, milionário, aristocrata?

Tiririca foi o candidato que mais votos obteve, em todo o Brasil, em sua eleição a deputado federal. Algo superior a 1.300.000 votos. E no Estado de São Paulo, ainda reconhecido como o mais desenvolvido do país, das milhares de escolas, das centenas de faculdades, das maiores universidades. O povo, cansado de ser palhaço, votou num palhaço. Um dos líderes do professorado paulista, o ainda deputado Roberto Felício, não se reelegeu. Voto de protesto, voto de zombaria, voto de cansaço? Seja lá o que for, a votação de Tiririca não pode ter a sua legitimidade contestada, a não ser, como se tentou agora, pela alegação de que ele não reunia condições legais para ser candidato: seria analfabeto. Logo, poderia votar, mas não ser votado.

Agora, o TER confirma que, nos testes a que foi submetido, Tiririca passou: ele conseguiu ler e escrever. Talvez, seja apenas mais um dos nossos milhões de analfabetos profissionais. E, se o sistema é representativo, por que negar-se, então, a essa categoria de brasileiros tão grande – a do analfabetismo funcional – o direito de ser representada no Congresso? Por que não, uma bancada deles, se já temos a bancada evangélica, bancada dos banqueiros, bancada dos ruralistas, bancada sindicalista, bancada dos partidos nanicos? Ora, não se pergunte o que Tiririca irá ou poderá fazer no Congresso Nacional. Pois, se alguém o fizer, terá de perguntar, também, o que nas duas casas, em especial na Câmara Federal, faz a grande maioria de suas excelências, deputados federais. Incluindo doutores, também alguns deles formados na USP. Tiririca, podemos ter certeza, por sua limitação intelectual, poderá causar um dano muito menor do que ladrões de casaca e de colarinho branco e com diploma superior. Bom Dia.

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