Educação: de tititi a trololó

Lavagem cerebralNo final do século 19, logo após a proclamação da República, o nosso Prudente de Moraes foi indicado para assumir o governo de São Paulo, antes de ser eleito presidente da República, o primeiro civil. Poucos se lembram disso. Ou sabem. No entanto, o exemplo de estadista Prudente de Moraes mostrou-o tão logo assumiu o governo paulista, quando indicou a sua prioridade: a educação. Convocou Caetano de Campos para reestruturar e refundar o ensino de São Paulo e sua inspiração estava em Piracicaba, na pedagogia que Martha Watts infundira ao Colégio Piracicabano. Dessa pedagogia, nasceu a educação paulista, algumas décadas depois aprimorada por Lourenço Filho que viveu, aqui mesmo em Piracicaba, sua nova experiência educacional.

Educação, pois, é questão fundamental a que apenas estadistas dão prioridade, pois simples políticos interessam-se por obras vistosas e lucrativas, ao mesmo tempo que temem a inteligência, a cultura, o conhecimento. Para políticos, a educação do povo tem que ser mantida em baixo nível, pois povo educado é povo lúcido. E povo lúcido faz escolhas melhores, não se deixando enganar por efeitos pirotécnicos, por obras secundárias, pontes e viadutos, rodoaneis. Ora, estes podem ser importantes, mas se tornam absolutamente secundários quando realizados sob suspeitas e com dinheiro público que falta a setores vitais, como educação, saúde e segurança.

Ao início do governo de Fernando Henrique Cardoso, nos idos dos 1990, tive a honra de ser escolhido pelo CRUB (Conselho de Reitores das Universidades do Brasil) para redigir um texto que pudesse sintetizar o pensamento das universidades quanto à educação brasileira. Foi um dos mais árduos trabalhos a que fui exigido. E, no entanto, um dos mais preciosos em matéria de descobertas, de entendimento, de visão geral de um quadro que já se afigurava sombrio. Reitores das universidades federais, estaduais, públicas, comunitárias, particulares, confessionais, todos eles manifestaram preocupações e temores. A exceção ficava por conta das universidades particulares, entusiasmadas com o descalabro da educação, desmontada pelo governo federal. O recado que as demais enviavam a Fernando Henrique era de temor e de advertência: haveria o colapso na educação, a começar do ensino básico. Aconteceu.

São Paulo, se foi pioneiro com Prudente de Moraes e continuou desfraldando a bandeira da educação por muitas décadas, vive esse colapso, apesar de suas estradas, viadutos, pontes, obras que não disfarçam o caos educacional, a tragédia na saúde, as visões dantescas de cidades inteiras levadas por enchentes e descuidos administrativos. Em política, há a velha pergunta de Harold Lassewll: “Política: quem ganha o que, quando, como?” A resposta está sempre na análise de obras físicas, vultosas, nas secretarias e ministérios de obras públicas. Quanto à educação, não há a mesma pergunta, porque o único a ganhar seria o povo e, portanto, o único também a perder.

No final do governo de Fernando Henrique Cardoso, alguém com boa memória haverá de se lembrar que José Serra, já candidato, dizia que o Brasil batia às portas do FMI “porque a vaca estava indo para o brejo.” Fernando Henrique, a seus opositores, dizia que protestos e queixas e reclamações não passavam de tititi e de nhenhenhém. Deu no que deu, na derrota implacável, na vitória do povo, numa mudança de rumos para o Brasil que, apesar de ainda com graves problemas, começou a trilhar um caminho sem volta.

Agora, com a justa, justíssima greve dos professores, José Serra, discípulo bem amado de Fernando Henrique, repete o que lhe ensinou o mestre: “Trata-se de trololó dos professores.” O desrespeito corresponde ao menosprezo que se tem dado à educação, numa política desastrosa que está mais ensinando adolescentes a apertar parafusos do que a pensar, mais mecanicismo do que humanismo, mais mão de obra para o mercado do que formação espiritual, física e moral de nossos futuros líderes. O tititi e o nhenhenhém de Fernando Henrique tiveram respostas nas urnas. O tempo dirá o que pensa a população em relação ao trololó de José Serra. Aliás, filosofia que, nas cidades governadas pelo tucanato, se repete como que numa cartilha: grandes e rentáveis obras materiais, desprezo aos fundamentos básicos do povo: educação, saúde, segurança. Bom dia.

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