Entre Líbia e Outono.

E lá chegou a hora e a vez também da Líbia. O Ocidente, quando não sabe o que fazer, acaba encontrando algum motivo para bombardear o Oriente. E o pretexto é sempre o mesmo: lutar pela democracia, pelos direitos humanos, proteger cidadãos indefesos. E Estados Unidos e aliados vão matando, invadindo, atropelando, como que repetindo o que já fizeram em Hiroshima e Nagazaki, a mesma hipocrisia de sempre. Direitos humanos existem apenas para os amigos. Que, no entanto, podem se tornar inimigos, conforme os interesses do momento. Kadafi – da mesma forma que Sadam Hussein, Mubarack do Egito, o próprio Bin Laden – deixa de ser aliado quando se torna inconveniente. O nome da hipocrisia é diplomacia. E o da moral, “real politik”

Pois é. Estive pensando em comentar algo sobre isso, mas eis que um outro valor ainda mais alto surge, trazido pela roda do mundo, pelo ciclo das estações: o Outono. Ora, a eterna divergência entre Oriente e Ocidente continuará, ciclicamente, até o final dos tempos. Para o Oriente, o Ocidente continua sendo aquele terrível e sombrio “caminho da morte”, onde vagavam os mortos, os monstros das lendas. E o Ocidente perdeu a mínima consciência do que fora o esplendor do Oriente, aquele que nos servia de orientação. Pois é isso mesmo: oriente, orientar, orientação. Quem o perde, desorienta-se. Ou é falso que já estejamos desnorteados?

Eis,pois, que chega o Outono. Que é consagrado a Dioniso, deus do vinho. A simbologia outonal é toda feita de parras de vinho, da lebre saltitante e fértil, das cornucópias que revelam abundâncias transbordantes de frutos. Outono é prenúncio daquele tempo de estar diante da lareira, o Inverno. Há, pois, que ser vivido, aproveitado, curtido, saboreado. Ora, Dioniso é mais fascinante do que Marte, esse deus da guerra que tanto parece seduzir o Ocidente. Logo, enquanto os Estados Unidos e seus aliados insistem, na chegada do Outono deste nosso hemisfério, a bombardear e a invadir outro país oriental, faço minha opção intelectual e de vida: prefiro estar no Outono, esse tempo de ficar, de refletir, de amar com serenidade, de saborear as belezas maduras da vida. Ainda bem que as estações do ano nos dão pistas do que seja o eterno retorno, na vida e no mundo. Assim como o Outono chegou com suas promessas de sabores e de saberes, a Primavera está sorrindo em outros lugares. E o Inverno apenas permanece na alma dos guerreiros, dos suicidas que fazem, da política internacional, a fonte sanguinolenta que alimenta cupidezes, ambições e desumanidades. Bom dia.

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