Espertos e otários

Diz-se que o diabo sabe das coisas não por ser diabo, mas de velho que é. Viver bastante tem lá, pois, suas vantagens. Ando gostando. Basta aprender a não levar a vida a sério. E ter bom humor diante das inacreditáveis tolices humanas. Elas se repetem numa rotina admirável.

Afinal de contas, “nada há de novo sob o Sol.” E tudo “continua como d´antes no quartel de Abrantes”. Basta imaginar que continuamos a ouvir Bach, Beethoven, Mozart com o mesmo deslumbramento de nossos antepassados. Ou – para o diabo não ir tão longe – aí estão Roberto Carlos, Chico Buarque, Caetano Veloso, amados pelas novas gerações como se elas estivessem descobrindo a grande novidade. E estão. A boa nova é isso: o eterno que se anuncia a todo tempo.

Diabos velhos, os nossos políticos continuam prometendo coisas, novos empregos, reformas disso e daquilo, caça à corrupção, embora José Serra esteja apenas querendo caçar fumaça de cigarro. Na verdade, Muda o vinho, os barris são os mesmos. Ou mudam os barris, o vinho é o mesmo. É, por exemplo, de sabedoria fundamental em política saber mentir. Nunca, para se ganhar algum crédito, se pode mentir pouco ou pela metade. Mente-se tudo, repetidamente, mente-se à grande. Uma mentirinha desmoraliza. A grande mentira soa de maneira espetacular. Desde Maquiavel, passando por Goebbels, todo bom político sabe disso. Aqui, na amada e querida terrinha, o adorável Bentão – o Bento Dias Gonzaga cuja memória não tem sido corretamente cultivada – era um mestre na arte do populismo, da demagogia bem feita. Pois populismo e demagogia são ciência e arte, demandando muito talento e vocação.

O velho Salgot Castillon – que deixa saudade permanente – assumia-se, com orgulho e vaidade, como político populista e demagogo. Afinal de contas, é preciso lembrar que, originariamente, a palavra demagogia tinha o sentido primitivo de “conduzir o povo”. Demagogo, pois, era o condutor do povo, que o fazia com “sabedoria e justiça”. Até isso foi banalizado e vulgarizado. Bentão – na lembrança dos diabos velhos ainda vivos — foi um dos nossos mais competentes populistas e demagogos, em todos os sentidos das palavras. E ele tinha um conselheiro admirável, um gênio político, nosso Maquiavel caipira, nosso Richelieu, nosso Mazarino: Geraldo Carvalhaes Bastos. A política de Piracicaba perdeu o sal e a graça quando Geraldo Bastos se afastou. Ele trocou a política por religião e continuou líder formidável, um populista da fé, um santo demagogo.

A farra da criação de empregos dos governantes atuais, sejam municipais ou federais, não é mágica e nem tem originalidade. O Geraldo Bastos e o Bentão –ainda no final dos anos 50 – já conheciam a “pesca milagrosa”. Bentão era candidato a deputado ainda outra vez, eleições difíceis. Já naquela época, o sonho do eleitor malandro ou necessitado era ter emprego público. Bentão e Geraldo não hesitavam: prometiam tudo. E a todos. Às vésperas da eleição, lá se foi o nosso inefável Geraldo Bastos – amigo cuja ausência me deixou vazios sem fim — com a grande mentira, que políticos atuais pensam ser coisa nova: enviou 5 mil telegramas, informando que o “Diário Oficial”, no dia seguinte ao da votação, publicaria a relação dos nomeados. E que o “amigo eleitor” procurasse seu nome na lista. Não se dizia que o “amigo” fora nomeado; insinuava-se a promessa deliciosa: um emprego no Estado!

Bentão recebeu um chuva de votos. Foi a última vez. Nunca mais se elegeu. Pois no “Diário Oficial” não saiu nada…

A verdade é que existem políticos espertos apenas porque há eleitores otários. Bom dia.

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