Good news, no news

Um ainda jovem eletricista – que me presta serviços e se me tornou bom amigo – recebeu uma terminante orientação médica: não ler jornais ou ver noticiários de televisão pela manhã, antes de se dirigir ao trabalho. E, nunca, à noite e antes de dormir. O moço estava entrando em estado de depressão sem saber o motivo. E o médico detectou uma das causas: a pressão negativa da informação também negativa no ânimo e no estado de espírito das pessoas.

Sem ter ido ao médico e sem precisar de orientação, tomei a mesma decisão já faz algum tempo, pois havia percebido, após leitura de jornais e ver informativos de tevê, que minha pressão arterial se alterava. E se, como ainda jornalista, eu nada posso fazer, pois vivi a experiência da mórbida atração da má notícia sobre os leitores, tudo depende de mim enquanto leitor. Pois me lembro que, há umas duas décadas, ainda dirigndo O DIÁRIO, tomei uma decisão que terminou em total fracasso: aboli o noticiário policial, pretendendo, com aquela atitude, colaborar com a elevação do nível de qualidade do noticiário. Qual o quê! Em menos de uma semana, a pressão dos leitores foi tal que precisei, para evitar cancelamento em massa de assinaturas, reabrir o espaço mórbido do noticiário policial, mortes, assassínios, tragédias, roubos, estupros.

Confesso estar entre os românticos do jornalismo, pois tentei viver algo missionário e educativo, ainda tento. Mas, ainda adolescente, quando discutia com o saudoso Sebastião Ferraz, então meu diretor no “Diário de Piracicaba”, a respeito do significado de notícia, do que era ou não notícia, ele me deu a lição clássica da época: “Good news, no news”. Ou seja: a boa notícia não é notícia. O que equivale, convenhamos, ao reconhecimento de uma realidade mórbida inerente a essa misteriosa raça humana, capaz de produzir, numa só pessoa, o santo e o pecador, o herói e o bandido, o criminoso e o pastor de almas, um Bach e um Hitler.

Penso nessas coisas, hoje e ainda agora, porque ando tentado a provar a inutilidade de toda e qualquer campanha pelo controle da natalidade ou preocupação quanto à explosão populacional. Se depender do que ainda vejo nos poucos informativos de tevê a que assisto, está dando-se o contrário: a humanidade anda prestes a desaparecer. Não tive paciência de fazer anotações, mas ainda tentarei fazê-lo em defesa de minha tese, pois, a cada dia, o noticiário sobre mortes e tragédias aumenta. Um furacão matou 200 na China; um temporal afogou mais 100; no Paquistão, bomba matou 200; 300 outros foram exterminados com ataques no Afaganistão; uns 50 morrem diariamente em São Paulo em acidentes de trânsito, em desmoronamentos; nas estradas, as mortes contam-se aos milhares. E, no Rio de Janeiro, o tiroteio entre policiais e traficantes ou entre policiais-traficantes, traficantes-policiais e policiais não traficantes é uma guerra civil. Morrem, em cada minuto, milhares de pessoas em tragédias e lutas e conflitos. Uma criancinha leva nove meses para nascer.

Desapareceram, da imprensa, as colunas de nascimentos de pessoas, ficando apenas os obituários. Nascer é “good news” e, portanto, “no news”, quando não “bad news”. Lembro-me de que, certa vez, por curiosidade, procurei se houvera registro de meu nascimento nos jornais da época, em junho de 1940. Houve. E justamente no “Diário”. Lá estava que eu nascera, “um robusto pimpolho”. Fosse hoje, o pimpolho estaria no limbo da não-notícia.

Tempo está chegando em que jornais e informativos de rádio e televisão deverão ser precedidos de advertências: “se ler ou ouvir, não saia de casa”. Ou: “este produto faz mal à saúde”. Bom dia.

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