Grandezas e pequenezes

Confesso não saber o que mais admiro no ser humano. Se sua inteligência, se sua estupidez; se a sua força, se a sua fraqueza; se a sua bravura, se a sua covardia. E,enfim, se suas grandezas, se suas pequenezes. Na realidade, penso eu, somos, entre todas as espécies, a mais complexa, o animal mais estranho. O egocentrismo é absurdo. E o egotismo, mais ainda.

Há muitos e muitos anos, descobri uma terapia infalível para enfrentar a tentação da soberba, da pretensão, da burrice extrema. Foi em São João da Boa Vista, onde nosso grupo de leigos foi fazer uma série de palestras. Ficamos hospedados numa chácara deslumbrante, com todo o conforto possível e imaginável. Com minha incapacidade para dormir muito, lá ficava, eu, madrugada a dentro, sozinho e solitário. E, numa daquelas madrugadas, deitei-me no gramado e fiquei olhando para o mais deslumbrante céu estrelado que eu jamais vira. E admito: nunca vi outro céu tão deslumbrante como aquele de São João da Boa Vista, o que me dá saudade pungente.

Olhando as miríades de estrelas, meu pensamento voou, vagou. E fui encolhendo, encolhendo. Quem era eu, afinal? São bilhões de estrelas apenas em nossa galáxia. E há bilhões de outras galáxias com seus bilhões de estrelas. Quem era eu, então? Num universo fantástico, impossível até mesmo de ser imaginado, eu não chegava sequer a ser um minúsculo pó de estrelas. Por que, então, a prepotência, a arrogância, a soberba? Como é possível o ser humano se considerar, cada um per si, o mais importante do mundo? Encolhi tanto que, enfim,cheguei à minha dimensão real: com meus rompantes de grandeza, eu era apenas minúsculo.

De quando em quando, repito a experiência aqui mesmo, no jardim de minha casa. Há um pedaço de céu ainda não poluído por iluminação artificial. Desgraçadamente, ele também desaparecerá, pois a devastação urbana já está transformando as chácaras e sítios dos arredores em espigões que se assemelham a prisões sufocantes, mas que dizem ser apartamentos. Volto a pensar em morar em Santa Maria da Serra. Ou em Caiubi.

Anjos e demônios, santos e pecadores, justos e injustos, bons e maus, belos e horríveis, afáveis e brutos – conseguimos ser tudo isso numa só pessoa. Pequenezes e grandezas, portanto, convivem ao mesmo tempo num único ser humano. O grande cientista que projeta da ida o homem a Marte, de repente é abatido por uma ridícula dor de barriga. A mais bela e sensual mulher do mundo,torna-se uma bruxa se for acometida de sarampo ou catapora. O homem que enfrenta feras, que doma leões, pode ser mordido por um cachorrinho.

Estou pesando nessas coisas por pelo menos motivos especiais. O primeiro: descobrir um pai de santo forte que me proteja de olhos gordos que estão me atazanando a vida. E o segundo, a minha derrota absoluta, absurda, inquestionável diante de uma gripezinha vagabunda que me jogou na cama. O olho gordo deve ser de um amigo meu que, na véspera da gripe, me abraçou, efusivo: “Olá, homem de ferro.” Bastou ele falar, o ferro enferrujou. Bom dia.

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