Informar desinformando

Até alguns poucos anos passados, acreditei em ignorância e despreparo em alguns veículos de comunicação. Nos últimos tempos, acredito mesmo é em má fé. E má fé estúpida e tola, que parece não levar em consideração a inteligência, o conhecimento e a percepção de leitores, ouvintes e espectadores. Ora, sou veterano homem da imprensa, decano dela em Piracicaba. Vivi, no jornalismo, sob o tacão da ditadura e sei o que significa o tolhimento da liberdade.

Aliás, aqui mesmo e ainda recentemente, com o tucanato caipiracicabano, essa liberdade de pensamento e de opinião foi violentada, quando os atuais detentores do poder tentaram silenciar-me. Não o conseguiram, pois, se enfrentei tanques e baionetas, mais fácil me é enfrentar bicos de tucanos, especialmente quando mal intencionados. E eles sabem que eu sei.

Estou querendo dizer, apenas, que, com 54 anos de jornalismo pesando-me nos ombros, sei perfeitamente bem o que ocorre de pressão e de conveniência na e sobre a imprensa. Fracos e mal intencionados cedem, até mesmo por interesses pessoais. Profissionais e empresas jornalística sérias – e quanto mais pequeninas mais sérias são, ao contrário do que se propala por aí – mantêm viva a chama sabendo que ou se vive por uma vocação ou se morre por não vivê-la. Vocacionados podem ser derrotados, mas não são vencidos.

A má intenção e má fé que vejo, hoje, em certos núcleos da imprensa brasileira não têm outro nome senão o dos interesses de grupos e de classes. Parece que, no Brasil, a esclerose social teima em manter-se viva, mesmo quando já mumificada. Os mesmos grupos que levaram Getúlio Vargas ao suicídio, que tentaram impedir a posse de Juscelino Kubitschek, que deram o golpe para derrubar João Goulart ainda estão por aí, ainda que em estado terminal. E, contra o governo do presidente Lula, usam dos mesmos e surrados argumentos, das mesmas e ultrapassadas técnicas, das mesmas e insuportáveis estratégias para manter privilégios, benesses de capitanias hereditárias, heranças de sesmarias que apenas trocam de mãos.

Se não é tentar encontrar pelo em ovo, colocam-se chifres em cabeça de cavalo, como acaba de dizer o presidente. Ora, a celeuma toda – que se ergue em relação ao decreto do Plano Nacional de Direitos humanos assinado por Lula – não passa de farisaísmo. Este é o terceiro plano! Os dois anteriores, praticamente com as mesmas preocupações, foram elaborados no governo de Fernando Henrique Cardoso e, no entanto, nem os latifundiários, nem a imprensa, nem a Igreja, nem as Forças Armadas reclamaram, muito menos alegando que seriam a semente de um Estado ditatorial. A quem, afinal de contas, querem enganar? A serviço de quem está essa imprensa de má fé, que tanto se mostra melindrada quando alguém late aos portões de seus castelos?

A liberdade da imprensa é intocável, o mundo democrático sabe disso e respeita como um dos bastiões da própria liberdade. No entanto, liberdade implica responsabilidade e, acima de tudo, compromisso com esse que, ao lado de informar, é o dever da imprensa: o de formar. Informação implica formação, pois esta é um processo. A imprensa, ao mesmo tempo que informa, é formadora. Logo, se desinforma, ela deforma. E essa imprensa, portanto, não tem qualquer motivo para se considerar vestal intocável, a menos que seja vestal de confrarias suspeitas.

Outro aspecto que se tem sonegado: a imprensa, jornais e revistas impressos, tem uma natureza; os meios de comunicação de massa – rádios, emissoras de tevês e similares – têm controles, pois são concessões do Estado a grupos particulares. Ou seja: o povo, através do Estado, concede a particulares o direito de manter rádios e emissoras de tevês dentro de determinados critérios, incluindo de forma especial os educativos. Se qualquer emissora de rádio ou televisão fugir a suas responsabilidades e desrespeitar os limites de simples concessionários, estará sujeita à perda da concessão. E isso não é impedir ou limitar a liberdade dessa imprensa, mas um dever e um direito do Estado e, portanto, direito e dever do povo.

Se alguém usar rádios e tevês para minar estruturas democráticas, para violentar direitos humanos, para provocar tensões sociais, alarmismos e colaborar para destruir o tecido social – esse alguém perde o direito da concessão. É dever e direito do povo, através do Estado, dar fim ao abuso. Isso acontece com bancos, com instituições financeiras, com forças armadas que se aproximem da ilegalidade. Por que teria que ser suportado com uma imprensa eletrônica que fugir às suas atribuições?

Mesmo em relação a jornais impressos, a liberdade esbarra nos limites da responsabilidade. O vazio de uma lei de imprensa permite a bagunça geral. Mas bagunça não é liberdade. O nome mais adequado seria o da licenciosidade. Desinformar de propósito é um crime contra a cidadania. Nem a imprensa tem esse direito. A má informação – manipulada, distorcida, sonegada – é muito pior do que a desinformação. Esta pode gerar a inconsciência. A má informação, porém, forma consciências errôneas. Bom dia.

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