Maus inícios

Já se iniciou a partida de 2010. O pontapé inicial, deu-o o Presidente Lula. E há pessoas preocupadas com os primeiros comentários, a troca de acusações, arremedos de coligações, negociatas. Recuso-me a opinar, pois sei haver milhares de cidadãos que acreditam, ainda, em campanhas políticas limpas e leais. Ora, não tenho o direito de desfazer ilusões. Mas não acredito nisso. Já conheço as vísceras do monstro.

Nunca vi campanhas políticas verdadeiramente limpas. Nem mesmo para eleger diretoria de time de futebol varzeano. O jogo é bruto. O poder enlouquece. O mínimo que se poderia esperar é lealdade. Mas em tempos pragmáticos, o “importante é levar vantagem sempre” e é única a lei, a do “vencer ou vencer”. Nessa cegueira, mesmo lealdade é temerário esperar-se de litigantes. As regras do boxe e do futebol são, certamente, mais cavalheirescas. E decentes.

Numa outra luta, o “vale tudo”, havia elasticidade no regulamento, regras mais flexíveis. No entanto, tinha que se respeitar pelo menos uma delas: não atingir as partes baixas do adversário. Em política, bate-se da cintura para cima e da cintura para baixo. Bate-se por trás, bate-se de lado. Só não se bate pela frente. Pois, para isso, é preciso lealdade. Em política, importa o resultado, independentemente dos meios. Como o lucro, o voto não tem cheiro, cor, religião ou origem. O contrário disso existe e tem nome: ideal. No mundo político, porém, ideal é sinônimo de poesia. Ou de ingenuidade.

Ora, ao mesmo tempo o Brasil fala em sediar Olimpíadas, nas quais há expectativas de ideais universais, confraternizações e, especialmente, do ainda inatingível “ideal olímpico”, sintetizado na frase quase singela: “o importante é competir.” Vencer ou perder, portanto, detalhe. Foi o sonho de Pierre de Fredy, o Barão de Coubertin, buscando, em 1896, recriar o sonho olímpico dos jogos da Antigüidade Grega. O sonho tornou-se pouco olímpico, se, por olímpico, entender-se, também, a metáfora do majestoso. Olimpíadas marcam-se por interesses econômicos e disputas ideológicas entre países. Nelas, o importante é vencer, como confirmando a “Humanitas”, teoria do machadiano Quincas Borba: “Aos vencedor, as batatas.” Danem-se os vencidos. Como em política. Como no mercado.

Minha geração vem de um mundo já muito lá de trás. Após a II Guerra Mundial, as primeiras décadas foram de lutas de reconstrução universal, o idealismo proposto por mundos irreconciliáveis: comunistas, socialistas, as esquerdas, numa frente; liberais, neofascistas, a direita, em outra. A partir de ideologias diferentes, propunham sistemas econômicos também diferentes. Mesmo conflitantes, as idéias, no entanto, irradiavam-se a partir de um centro marcadamente humanista. Num vasto caldeirão de “ismos”, políticos e intelectuais tinham o que dizer. No final, apenas o poder econômico venceu. E o bem comum passou a soar como ingenuidade.

Se há ou houve, portanto, campanha eleitoral inteiramente limpa, confesso não tê-la conhecido. O pontapé inicial de 2010 é apenas uma “avant première”. Quero ficar à distância, pedindo ajudem-me, os céus, a ter esse mínimo de sabedoria. Os quadros estão aí, postos e claros: o antigo, que já conhecemos; o atual, que estamos conhecendo; o novo, que ainda não se conhece. Voltar, ficar ou tentar. Como diz o povo, “vai ter para todos os gostos”. Os primeiros indícios são ruins. E bom dia.

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