Moços de Lupicínio

picture (23)Tento provocar questões que me parecem essenciais, ainda que se tenham transformado, na vida de alguns, simples coisas superadas. Pai e professor é que ensinam. Mesmo assim, apenas se e quando filhos e alunos querem aprender. De minha parte, não tenho mais a quem ensinar o mínimo necessário à vida. Viver, afinal de contas, vive-se vivendo. Não saber disso é apenas sobreviver. O que, hoje, já é muito.

Portanto, nada tendo a ensinar, nem a quem, ouço. Ou finjo que ouço. Ora, a versão é sempre maior do que o fato. Criam-se lendas, fantasias, inventam-se histórias, fazem-se heróis, constroem-se covardes. E novamente no jardim de meus silêncios, lá estava, eu, entre jovens. A algaravia me atordoou. E os fiapos de conversa que ouvi cansaram-me. A canção reapareceu-me, então, não sei se nos ouvidos, se na alma: “Esses moços, pobres moços…. Ah! se soubessem o que eu sei. Não amavam, não passavam aquilo que eu já passei.” Claro que de Lupiscínio.

Os moços não falavam, palravam. E perguntavam coisas que eram mais versões e lendas do que fatos verdadeiros, reais. Ora, nunca as provoquei mesmo porque, entre críticas que me fazem, a mais severa é a de eu não camuflar sentimentos, emoções. Foi-me sugerido, quase sempre, escrever racionalmente, como se a razão fosse assassina do coração. Ter-me-ia sido a morte, aprisionar-me a estruturas apenas racionais de pensar. Coração e razão são cúmplices.

Completo 52 anos de escrevinhações. E, nos escritos, ficou o cotidiano de minha alma. Masquem não entende de almas quer explicações, razões. Não há razão alguma. Nem explicação. A vida é pulsação. Acreditar nisso é ir-se ao ritmo dela, em duração e ênfase. Como a música, o ser humano apenas existe no tempo. Logo, há que se viver ao compasso de cada composição. E na agonia de existir. É agônico o pêndulo entre o deslumbramento da vida e os limites de si mesmo.

Curiosos, os moços perguntavam de prisões, de torturas. Disse-lhes de torturas psicológicas, de rápidas detenções, de longas prisões domiciliares – o meu não saber se a dor na carne dói mais do que o doído na alma. Se valeu a pena? Fernando Pessoa já o respondeu: só não vale a pena se a alma for pequena. E, então, quiseram saber de amores, de mulheres e de paixões. Ri, ri-me: estão mais vivas do que imaginei as lendas de Camelot.

Há gentes de quem temos vontade de gostar. E só de ter vontade, já se está gostando. E o olhar de nossos olhos – o olhar dos olhos deles, o olhar dos meus – encontravam-se no caminho. Aquele era um encontro, inesperado como os preparados pelo destino ou pelo acaso. Pensei em Steinbeck, no destino que viaja de ônibus. Talvez fosse o destino num canto de jardim. Apenas falei: “Amar, amei.”

Quem há de mais triste do que o medroso de amar? O amor é privilégio, graça. E, por isso, milagre na vida de quem o recebe. Não há vulgaridade no amor. Se houver, amor não será. Em aventuras se apequena e vulgariza a vida.

Um homem vivido confessaria não ter amado tanto ou quanto desejou; mas que amou mais do que mereceu e menos do tanto e quanto disseram que amou. Na verdade, há um único amor na vida. E tão plenificante que parece anterior à própria vida. Por isso – se o perde ou se o amor se vai – o homem o persegue ao longo da existência, na esperança de reencontrá-lo. Ou de repeti-lo. Novos amores não passam, na verdade, de uma quase que insuportável vontade de outra vez.

Ora, quando se ama alguém, está amando-se o amor. Mas os moços, pobres moços, não sabem o que eu sei… Bom dia.

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