O sorriso do Velhinho

É óbvio que as novas gerações pouco sabem do que aconteceu. Mas foi em 1950, quando Getúlio Vargas – depois de seu governo ditatorial, retornando ao poder em eleições livres – foi como que carregado pelo povo, voltando à Presidência da República. Nunca se vira nada igual em matéria de vibração popular. Com praticamente a metade dos votos, Getúlio, quase sem fazer campanha, retomava o poder.

À época, as marchinhas carnavalescas eram um retrato musical e vivo da realidade brasileira. Havia imaginação, havia sátira, ironias mordazes e, também, manifestação da vontade popular. Com a vitória de Getúlio, aquele Carnaval foi movido por uma música, de Haroldo Lobo, que se espalhou por todos os salões e ruas. O refrão falava tudo: “O sorriso do velhinho/ faz a gente trabalhar.” O Brasil movia-se pelo otimismo, pelo sorriso, pelo jeito paternal e bonachão de Getúlio Vargas, o maior de nossos líderes populistas, o mais carismático e, na verdade, o construtor do Estado brasileiro.

Como se explica um ditador tão amado pelo povo? Hoje, em tempos de individualismos e de consciências mais sólidas, seria praticamente impossível. Pois os valores democráticos se impuseram e a liberdade se firmou como bem intocável. No entanto, o paternalismo e o populismo continuam vivos. Getúlio, no Brasil, e Perón, na Argentina, são testemunhos de que a imagem de “pai dos pobres” é visceralmente ligada à alma das populações mais carentes e sofridas. Evita Perón, ainda hoje, é celebrada na Argentina como se fosse uma santa. E a imagem de Getúlio Vargas perpassa o ideário de nossos políticos, quer para tentar repeti-la, quer para contestá-la.

No Brasil destes últimos anos, estamos assistindo a um dos mais espetaculares – e eu diria que quase inexplicável – fenômenos de liderança política calcada no populismo, num paternalismo mitigado e, ao mesmo tempo, numa visão desenvolvimentista pragmática. O presidente Lula está conseguindo – apesar dos que teimam em não enxergar, coando sol com peneira – ser uma simbiose de origem operária do populismo de Getúlio Vargas e do desenvolvimentismo de Juscelino Kubitschek. Ele atinge o coração do povo, que o poupa e o protege. A mesma tentativa de destruição que partidos e classes conservadoras tentaram contra Getúlio Vargas e Juscelino manifesta-se sobre Lula. São os mesmos argumentos, os mesmos motivos, as mesmas objeções. E – a história repetindo-se como farsa – temos visto o PSDB e o DEM repetindo a mesma rançosa caminhada da antiga UDN.

É um fenômeno político espantoso: quanto mais se bate em Lula, mais ele cresce aos olhos do povo, mais é acolhido pelo coração dos brasileiros. A reverência com que o presidente Lula é tratado no concerto internacional, o respeito dos Chefes de Estado, a posição ímpar a que o Brasil chegou contrastam com os muxoxos dos que – por interesses político-partidários, por idiossincrasias ou por preconceitos insuperáveis – negam a força imantadora desse animal político chamado Luiz Inácio Lula da Silva.

Se Getúlio se tornou maior do que o PTB, se Juscelino cresceu mais do que o PSD, Lula ficou acima e além do PT. Lula sorri e chora, fala a linguagem do povo nos mais sofisticados salões da corte, brinca e fala a sabedoria popular que círculos elitistas dizem ser gafes. E é como se o filme se repetisse em nova versão. Pois, se o sorriso do velhinho fazia a gente trabalhar, o jeitão de Lula faz o povo se entusiasmar. A esperança voltou. E, com ela, os sonhos que se vão tornando realidade. Bom dia.

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