Posse e festa de emoções.

Não me lembro de ter acompanhado, pela tevê, uma festa de posse presidencial tão serena, sem sobressaltos e calma como a da presidenta Dilma Roussef. Tratou-se, certamente, de um testemunho de maturidade e normalidade democráticas, dentro de um quadro definido pelo povo. A mulher – que, durante a campanha eleitoral, foi massacrada por adversários desesperados – lá estava inteira, altiva, de personalidade forte, pronta para substituir um homem carismático como poucos iguais se viram no mundo. Lula é fenômeno permanente que, mesmo ao deixar o governo, imanta, magnetiza o povo, numa comunhão como nunca o Brasil presenciou.

Foi uma festa de emoções, de simbolismos, mesmo porque o Brasil parece convencido de que o caminho escolhido não será alterado substancialmente, mas com as reformas necessárias, com os ajustes que precisam ser feitos. Dilma Roussef – que foi, verdadeiramente, “cabeça e mãos” do governo Lula – mostrou tal desembaraço na solenidade e entre a classe política daqui e de outros países que confirma a sua familiaridade com o poder. No entanto, ela – tida como mulher racional, desprovida de emoções – mostrou a sua face sentimental ao emocionar-se à lembrança de acontecimentos de sua vida, de seus companheiros torturados e das lições aprendidas com Lula.

O Brasil recebe sem surpresas a festa da posse. E, com serenidade absoluta, o surgimento de um novo governo que se prevê seja uma continuação aperfeiçoada do anterior. O fato, porém, é que dificilmente o povo brasileiro conseguirá esquecer-se de cenas que, na subida e na descida da rampa, envolveram Lula e Dilma, seus abraços emocionados e fraternos, suas lágrimas, sua cumplicidade e – sem qualquer desdouro para a atual presidenta – uma relação afetiva que extravazou como sendo a de um pai para com uma filha, a transmissão de uma herança. O respeito de Dilma para com Lula foi o de, por assim dizer, uma devoção filial. E o carinho de Lula por Dilma ficou claro seja como sentimento também paternal. Diga-se o que se disser, pense-se o que se quiser pensar, mas houve um simbolismo que me pareceu notável: Lula, como se o Brasil fosse um filho seu, entregava o país e o povo aos cuidados de alguém de sua confiança. E Dilma acolheu a herança desses cuidados.

A saída de Lula do palácio presidencial, a dificuldade que teve para se desvencilhar dos abraços do povo, as demonstrações de dor de despedida passam a ser imagens que ficaram num porta-jóias de nossa história. Dilma é uma expectativa; Lula é uma história consolidada, um fenômeno político e popular que ninguém consegue entender pela razão. Mas que acolhe e compreende no coração. Lula, com 87% de aprovação, sai do governo não apenas como um líder carismático, mas como o bem amado da gente brasileira. Como alguém do povo já disse, deixará saudade. Mas já se sabe que ele estará por aí. E foi o que Dilma transmitiu ao povo: “Lula estará conosco.” E, com isso, ela amenizou um pouco a saudade, que é essa vontade de outra vez.

Mas, ao final, a impressão foi a de que nem Lula saiu, nem Dilma chegou. Ambos ficaram. Bom dia.

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