“Quem é você que não sabe o que diz?”

Marina-Silva_ACRIMA20110222_0046_13 (1)Qualquer escrevinhador com um mínimo de sensibilidade sente-se constrangido em criticar o pensamento de Marina Silva. Ela, pessoalmente, mostra-se tão angelical, tão suave e delicada, quase frágil em sua postura gentil – que, a muitos, poderia assemelhar-se a uma santa. Não fosse casada e com filhos, Marina – para seus admiradores mais empolgados – poderia ser vista como “A Virgem Negra da Amazônia”. Mesmo porque a gloriosa Amazônia é pródiga em lendas.

Mas Marina – transformada por esse aparente vendaval de apoio eleitoral – complica-se ao tentar explicar o inexplicável. A grande questão é que, defendendo valores idealístiscos – que coincidem com o desejo de todo eleitor generoso – Marina enrosca-se no emaranhado político. Neste, o jogo é outro. E vale, para ele, a velha imagem do monte de sujeira e o do bando de moscas. O discurso de Marina propõe a mudança de moscas. O monte, porém – que é o sistema – continua o mesmo. Com discursos utópicos, até as moscas irão chorar de tanto rir. Marina não pode e nem sabe como mudar o monte.

O que anda dizendo, afinal de contas, a Marina-candidata nestes últimos tempos? Ao escriba – experimentado em ver e ouvir dissimulações e simulações de candidatos – Marina se torna personagem vivíssima de uma célebre composição do inimitável Noel Rosa. Lá pela década dos 1930s, o “Poeta da Vila” teve uma polêmica musical com outro competente sambista, Wilson Batista. Noel e Wilson respondiam, um ao outro, por músicas que fizeram grande sucesso.  Constatando as contradições e falta de lógica de Wilson Batista, Noel compôs o samba que se tornaria imortal e que diz: “Quem é você, que não sabe o que diz?/ Meu Deus do céu, que palpite infeliz!”

Água e óleo não se misturam, apesar de Marina – como que à espera de um milagre de sua crença evangélica – acreditar que isso possa ocorrer em política. Ela começou por uma crença temerária. Pois, ao saber da morte de Eduardo Campos, ela se recolheu – como se noticiou – para ler a Bíblia, meditar e encontrar respostas à tragédia. Ao aceitar ser candidata, viu, nisso, a vontade de Deus: “Foi a Providência”. Ora, isso dá margem a diversos entendimentos. Entre estes, não se pode negar um de péssimo gosto: Deus teria matado Eduardo Campos para Marina ser candidata! Que coisa, hein?

Depois, o outro avião, também envolto em confusão e sombras. Marina faz questão de dizer ignorar a origem dos financiamentos de sua campanha. Nada há de mais cômodo do que isso, que se resume: “Eu não sei, não tenho nada a ver com isso.” Deusa que não sabe o que fazem os seus anjos, de onde vêm recursos é, no mínimo, convenhamos, deusa fora do ar. Aliás, fala-se em Piracicaba que o primeiro avião – que caiu com Eduardo Campos – pertencera a um piloto cá da cidade, recentemente falecido.

Agora, Marina escorrega nas cascas de banana lançadas por pastores evangélicos que pretendem – e parecem estar conseguindo – aprisioná-la a seus dogmas e  teorias. No projeto de campanha, Marina apresentou uma visão favorável à união homossexual, questão que líderes evangélicos vêem como obra do demônio. Foi surpreendente: Marina mudara de posição? Não passaram mais de algumas horas, Marina corrigiu-se: foi um erro de edição, de revisão, do raio que os parta. Quem, porém, tem experiência em editoria sabe que erros há, mas de conceito não. Mudam-se palavras, frases, pontuação, concordância, etc. Mas não se erra quando a mudança é de parágrafos inteiros. Ainda mais quando os conceitos são diferentes. O nome disso é correção, mudança de texto. Marina foi forçada a recuar.

Mais corda bamba: Marina foi a líder mais agressiva contra o  agronegócio. Agora, diz não ser tanto assim. Em política, a mosca-azul é capaz de mudar tudo, não apenas pensamentos mas, também, a alma. Voto, como se sabe, não tem ideologia. E Marina Silva tem – como candidata colocada no campo de batalha – todo o direito de mudar, de fazer composições, de unir-se a antigos adversários, de renegar princípios e adotar outros, tem direito ao escambal! Pois isso é parte do jogo que ela decidiu jogar. Mas o que Marina Silva não pode fazer é – mudando – continuar declarando-se diferente dos outros. Ou ela, se for eleita, governa com os demônios da atual estrutura, ou não governará com os anjos que ela, como deusa, imagina ter como aliados.

Por enquanto, Marina tem-se mostrado personagem de Noel Rosa: “quem é você que não sabe o que diz?” Bom dia.

3 comentários

  1. wilhe gerdes em 01/09/2014 às 11:24

    Éh!..meu amigo. Mais uma vez você acertou NA MOSCA!
    Forte abraço.

  2. Luiz Thomazi em 01/09/2014 às 20:31

    Perfeita sua análise, Cecílio! Abraços e boa sorte pra nós…

  3. Delza Maria Frare Chamma em 05/09/2014 às 10:47

    Muito bem descrita por Cecílio, Marina, candidata que diz, não diz, fala, “desfala” e, sobretudo, não assume estar aliada ao que de pior pode haver para um país que busca a Justiça Social. Aliada à obscuridade de forças religiosas altamente conservadoras, aliada à política recessiva dos bancos, ao megaempresariado, aos ruralistas e ao capital financeiro internacional, seu guru André Lara Rezende já afirmou o fim das políticas sociais, a necessidade de baixar os salários e que a política econômica não fará uso do pré-sal. Portanto… Cuidado no voto, brasileiro, pois o Brasil não pode caminhar para trás.

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