Reaprendizado.

Continuo dizendo-me – até para não esquecer – ainda estar vivendo minha “filosofia de UTI”. Quando se vê a outra margem, tem-se um lampejo de sabedoria na descoberta da própria finitude. Se sobreviver, o sabor é de prêmio. E, então, o homem será tolo se, pelo menos, não se rever, indo em busca de reaprender, de recomeços que lhe permitam seja, pelo menos, mais harmônico o restante do tempo finito. Rendem-se graças. Com os joelhos da alma.

Pouco antes da minha “escola de UTI”, fui em busca da Filosofia. Alguns estranharam um homem então com 58 anos de vida intensa retornar à faculdade. Era, porém, por essa razão: com 58 anos, senti ser preciso reaprender. E, especialmente, reaprender a pensar. Pois, o advento de um novo e fantástico tempo, de tecnologias formidáveis instala – no mundo e nas pessoas – o caos de inquietações e perplexidades. Novos desafios, valores em mudança, perguntas diferentes. Diante da fúria dos vendavais globalizantes, restara o quê? Quais estruturas; pilares, quais?

Comecei a reaprender, ainda reaprendo. E tentar entender, compreender exige esforços, lutas, sacrifícios, ainda que prazerosos. Obrigo-me a ler, a pesquisar e a estudar muito. Sei, porém, ser preciso ainda mais. Pois aprendi que o homem, antes de cidadão, há que formar uma boa consciência. E esta não existe sem boa informação, sem aprendizado, sem cultura, sem a busca incessante do conhecimento.

Essas considerações, faço-as em respeito ao leitor que me questiona: por que desimportar-me com a política da própria terra? Primeiro, por não ser mais a antiga e boa terra, de cidadãos apaixonados por sua história, mas um espaço caótico, oportunístico, tomado como que por abutres insaciáveis. E, depois, por ser desimportante qualquer política que busque apenas a interesses de grupos. Interesse haveria e deve haver se e quando o povo se organizar, como fazem pessoas e famílias que, em mutirões, limpam o que vendavais sujaram. A vida ensina que precisa ser respeitada a escolha do povo, até que ele se reveja ao descobrir que foi enganado ou que tem sido assaltado. Na ditadura, o povo precisava de porta-voz. Envaideço-me de ter sido um deles. Na democracia, o povo é o senhor de si mesmo.

Tenho muitas outras falhas. Nunca, porém, as de omissão. Nem mesmo agora, quando – na “filosofia de UTI” – reaprendo a pensar, querendo entender algo. É meu tempo como contador de histórias. Nem todas elas são bonitas. Mas, mesmo quando feias, não deixam, elas, de ser histórias. Merecem ser contadas.

Na solidão de minha finitude, publiquei uma série de reflexões. Concluí: “recuar, afastar, ficar à margem, onde, talvez, se possa ser chamado, de quando em quando, apenas para opinar, para contar. Não mais para fazer. A construção é outra. No final dos ciclos, das vidas, há a celebração cotidiana do solene, como que o ritual das coisas lentas. Soldados não podem ser idosos, generais podem.”

De quando em quando, opino. Não me punam por ter sobrevivido. Bom dia.

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