Redescobrir

Esse texto foi publicado em julho de 1988 no semanário impresso A Província. Recuperamos para lembrar os 30 anos de atuação em Piracicaba.

Redescobri algumas belezas da vida que, pelo menos para mim, pareciam mortas. Então comecei a compreender esse tempo de espera em que mergulhei, como se minha vontade estivesse bloqueada e nenhuma das propostas que por aí estão me apaixonasse.

Confesso que tentei, racionalmente, acreditar em pelo menos uma das múltiplas propostas de vida que atropelam as pessoas, mas não consegui. Sempre houve algo me barrando, como se a intuição fosse mais poderosa do que a razão.

Quando se está no palco, as luzes da ribalta ofuscam horizontes mais amplos. Não se enxerga além daquele espaço e chega-se a pensar que a verdade está ali. Mas ela está mais além e, por curioso que pareça, mais palpável. No palco, pensa-se que a vida é o desempenho daqueles papéis. Na plateia, há a ótica do observador, que pode sair ou aplaudir.

Ora, não me vi cúmplice de mais nada, pois as minhas pernas ficaram pesadas quando as da maioria corriam. Quis entender, não consegui. Parei, desisti. Houve, antes, muitas lutas que me apaixonaram, muitas maratonas que me entusiasmaram. Mas de repente a cabeça exigia, o coração segurava.

O que restou foi parar, observar, refletir – uma exigência da intuição, mais forte que todo o resto. E hoje dou-me por feliz, apesar do muito que tenha sofrido por me sentir prisioneiro da intuição. Pois a realidade, pelo menos é o que me parece, é a de que o filme está terminando, que a peça teatral desses tempestuosos tempos vai chegando ao fim, sem ter levado a lugar algum.

A peça termina e a plateia, cansada e frustrada, está vaiando o que viu, descontente com o que presenciou. Ficam subsídios para meditar, pois até os temporais destruidores deixam lições de vida. De minha parte, descobri belezas que continuam eternas, embora eu me equivocasse acreditando que estavam mortas.

Estão vivas. É um mundo real, o Brasil real. De pessoas simples, humildes, generosas, sinceras. O mundo dos pobres, que tem a sabedoria das belezas eternas. Eles não competem entre si, são solidários. Andam com os pés, não sobre rodas, pois têm o ritmo do sol e da lua, do dia e da noite. Bendigo a Deus por esse meu tempo de espera. Pois o filme de horrores chega ao fim – e o que irá começar é o do retorno à simplicidade. Bom dia.

 

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