Um lugar de e para viver

picture (51)Quando ainda no governo municipal, já há alguns anos, o então prefeito José Machado tentou mas foi impedido por vereadores e certos movimentos que se dizem democráticos. A proposta do prefeito era impedir a distribuição indiscriminada de folhetos nas ruas e esquinas da cidade, com evidente exploração do trabalho de menores e outros problemas conseqüentes. As esquinas tornaram-se pontos de irradiação de marginalidade: falsos ambulantes e pedintes, exploração do lenocínio, prostituição de menores.

Argumentos capengas bloquearam a proposta do prefeito. Dizia-se, de um lado, que aumentaria o desemprego, na defesa implícita da ilegalidade, desde que gerasse alguns míseros bicos. E que impedir a panfletagem seria ferir a democracia, impedindo, também, a livre circulação do pensamento, das idéias religiosas, etc. Foram argumentos anteriores à Idade Média, pois ignoraram as mil formas de comunicação de nossos tempos. Aliás, lugar de evangelização é nos templos, não nos espaços públicos. A Europa está atenta a isso.

José Machado chegou a convocar uma força-tarefa, unindo as polícias – civil, militar, federal, guarda municipal – mais secretarias municipais para realizar o que precisava ser feito: a blitz contra o crime, o espírito de “tolerância zero”. Quando José Machado foi derrotado por vereadores e movimentos ditos democráticos, pedimos-lhe esmurrasse a mesa. Ele chegou a virá-la, mas tudo voltou ao que era antes. E agora, há, como se fossem novos, movimentos contra poluição visual – da qual a Prefeitura é a principal responsável com seus outdoors escandalosos e ofensivos – e, também, à poluição sonora, que terá de atingir chácaras que se tornam clubes clandestinos, templos religiosos, bares, carros de som, etc. Quem ganha é Piracicaba. Mesmo porque, como se sabe, bandido tem medo de polícia. Ou tinha.

Não há que se criar novas leis, mas cumprir as que existem. Nenhum país sobrevive se suas organizações sociais não se assentarem sobre bases jurídicas sólidas. Filosofar sobre contravenções e delinqüência pode até ser papel angelical de acadêmicos. Mas contravenções e delinqüência, quando enquadradas em lei, têm que ser enfrentadas e punidas. Senão, as cidades desaparecem, as famílias esboroam, a civilização soçobra.

Cidades não são aglomerados de pessoas e de edificações. São lugares de viver. As pessoas constroem-nas para, nelas, instalarem seus lares, constituírem famílias, educar filhos, sonhar com o futuro. A democracia é determinada pela maioria, em respeito às minorias. No entanto, víamos minorias impondo-se às maiorias, afrontando-as, derruindo valores delas, menosprezando-os, muitas vezes com a complacência de intelectuais tolerantes que se divertem em brincar com o caos.

Um esforço de tolerância-zero deveria ser uma virada real de mesa para, novamente, Piracicaba ser um lugar de viver. Onde isso aconteceu – Nova York, Paris, São Paulo – os centros se revitalizaram, as praças retornaram ao povo. E, então, a humanização refloresceu, cidades menos submissas às leis interesseiras do mercado, mais sensíveis às da arquitetura e da arte. Da Berlim do pós-guerra, conta-se de uma cena que marcou o renascimento de um lugar e de um povo: era o homem do realejo retornando às ruas. E, depois dele, vendedores de flores e carrinhos de pipoca. E crianças e namorados, velhos casais passeando de mãos dadas. Após o horror das bombas, um lugar de viver.

Temos que exigir de nossos políticos e governantes, cobrar deles. Pois queremos de volta nosso lugar de viver, tão amado e tão belo. Bom dia.

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