Vida privada de pessoa pública

O sempre sóbrio economista Luiz Gonzaga Beluzzo – quem diria? – mal assumiu a presidência da S.E. Palmeiras e revelou o lado moleque e irresponsáel que caracteriz os torcedores fanáticos do futebol. Beluzzo já ameaçou agredir um árbitro de futebol, incentivando a torcida palmeirense a acompanhá-lo na agressão. E, agora, em festa da torcida Mancha Verde, em pleno palco, estimula sua gente a “matar os bambis”, referindo-se ao São Paulo F.C. e sua torcida. Ao mesmo tempo, para surpresa geral – como se estivesse sendo injustiçado – Beluzzo reclama da imprensa, dizendo-se injustiçado e invadido em sua vida pessoal. Perdeu o senso.

No entanto, essa transmutação de Beluzzo de sóbrio economista em vulgar torcedor fanático deveria servir-nos para algumas reflexões que, talvez, ajudassem a compreender um país cada vez mais confuso diante de seus novos tempos. Pois a realidade é uma só: o Brasil caminha, o Brasil cresce, o Brasil é respeitado no mundo todo, mas o povo brasileiro – em especial as diversas e poucas elites – não se deu conta de sua responsabilidade comum e cívica. O homem público brasileiro não tem, ainda, consciência da dimensão da vida pública e da vida privada. Privado e público confundiram-se e, assim, o que é de todos passa a ser apenas de alguns enquanto, para outros, o que é apenas de alguns deveria ser de todos.

Ora, há dimensões intocáveis e invioláveis na vida do ser humano: sua intimidade, sua privacidade, a honra e a imagem. No entanto, quando alguém se torna personalidade pública, tem que compartilhar as vidas pública e privada com a sociedade que representa, pois, em ato público, deixa de existir o privado. E isso se torna ainda mais necessário quando o homem público, na questão política, é eleito, pois, no Brasil, o voto é muito mais atribuído à pessoa do que ao partido.

Luiz Gonzaga Beluzzo deixa de ser pessoa física para se transformar em pessoa jurídica quando fala em nome da S.E.Palmeiras, da qual é presidente. E cada gesto seu e cada palavra, quando manifestados em público e na condição de dirigente, perde o caráter particular, pessoal e privado. Ora, se um homem leva sua vida privada ao domínio público esta se torna também pública. Por isso, quando o convite de Beluzzo, “matar os bambis”, feito em público, é levado às ondas da internet, ele não tem de que reclamar e, muito menos, de falar em justiça ou direitos pessoais. Na realidade, ele pode ter cometido o crime de incitação à violência, mas parece que, já como dirigente de futebol, isso não tem, para ele, mais nenhuma importância.

Infelizmente, no Brasil – num tempo em que o senso comum de pudor parece ter desaparecido – a grande maioria dos nossos homens públicos não consegue avaliar ou aquilatar a responsabilidade social de seu comportamento pessoal quando na dimensão pública. Homens públicos, se nem todos têm lideranças marcantes, todos têm influências determinantes. O lastimável de nosso país é que os maus exemplos continuam “vindo de cima”, enquanto, cá em baixo, o povo luta, acredita, crê e continua sendo traído. Bom dia.

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