A Virgem de Guadalupe e Paim Ciço

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A alma humana é feita de paixões. Por mais estejam ocultas, elas palpitam, agitam-se até que, finalmente, explodem. Paixão é algo que se não entende e nem se explica. Tolice será, pois, querer racionalizar o que está acontecendo no Brasil, nesta Copa do Mundo: um oceano de alegrias, de festas, de disputas, de emoções, de paixões desenfreadas. É a sagração da vida, no que ela tem de mais verdadeiro. Sem leis e sem regras, a não ser as do futebol que, porém, existem – também elas – para ser transgredidas.

Céus e infernos estão alvorotados. Pois todos os deuses e demônios, anjos e diabinhos, santos, querubins, arcanjos estão sendo invocados por multidões alucinadas. Na verdade, na verdade, isso não resolve nada pois – com um mínimo de calma e de tempo para raciocinar – sabe-se que, pelo menos o Deus cristão e sua corte, nada têm a ver com isso. Pode ser, até, que saibam o que seja uma bola. Mas, ao contrário do que acreditam os “atletas de Cristo”, eles não torcem, não favorecem e nem prejudicam ninguém. O único que se sabe é que Cristo, em sua condição humana, seria corintiano. Da mesma forma como o Papa – apesar de sua intimidade com os céus – é torcedor fanático do San Lorenzo de Almagro.

Será que o Papa teria rezado um tercinho pela Argentina? É segredo. Mas lá, nos escondidos do Vaticano, longe dos olhos do mundo e da Cúria Romana, pode ser, sim, que ela feito orações pelo e para o time de seu país. Seria uma injustiça, já que ele é íntimo do mistério. Mas não deixaria de ser humano, um homem também movido pela paixão. Sei lá.

O que me intriga é como ficarão os céus bombardeados pelos pedidos, orações e promessas de mexicanos e brasileiros. Afinal de contas, estarão em jogo – invocados por milhões de torcedores – duas poderosas potestades: a Virgem de Guadalupe e o Padim Ciço. Ora, direis: a Virgem é mais poderosa. Até concordo. Mas não é a fé que remove montanhas? Saibam, pois, que a devoção do nordestino pelo Padim Ciço é de tal forma entranhada, visceral, fé irracional que o padre-coronel se torna quase imbatível. E, agora, parece chegar o momento de ele ser alçado às glórias da santidade, pois – com tantos santos que o Papa Francisco têm formalizado – pode ter chegado, finalmente, a vez do Padre Cícero, luz espiritual dos nordestinos. Ora, se José de Anchieta pôde, por que não poderá o Padim e “paim” dos nordestinos?

Nessa disputa que tem aspectos escatológicos, admito estar torcendo pelos poderes do Padim Ciço. No entanto, meu respeito,  perplexidade,  aturdimento diante da Virgem de Guadalupe  tornam-me temeroso. Pois eu pensava ser, a história da Virgem e do índio, apenas uma lenda, bela lenda. Mas minha razão foi minada, derruída quando vi – com esses tais  olhos que a terra vai comer – o manto e os painéis da Virgem em sua Basílica, na Cidade do México. Aconteceu-me o inesperado: fiquei mudo, boquiabri. Lá estavam – revelados por estudos da NASA – os painéis onde se mostrav aquilo que se não explica. Ora, se a ciência não consegue explicar, a isso se dá nome de milagre.

A história conta que a Virgem apareceu, num deserto, para o índio que, amargurado, carregava, nos braços, o filhinho doente. Abreviando: o Bispo quis provas do que o índio contava. Ele apanhou, com seu manto, um buquê de flores, agasalhou-o e levou-os para o bispo. Quando se abriu o manto, lá estava a imagem da Virgem gravada no pano. Lenda? Não. A NASA – com toda a sua ciência e tecnologia – investigou e fez a descoberta espantosa: nos olhos da figura impressa no pano, estava a imagem do índio ajoelhado, com o filhinho nos braços. A Virgem vira-os e a visão ficou gravada em seus olhos. Minha razão foi, literalmente, para o brejo.

Por isso, o máximo que posso pedir – nessa hora dramática em que Brasil e México voltam a ser encontrar – é que a Virgem de Guadalupe não participe dessa disputa. E vá dormir, pelo menos nos 90 minutos do jogo. Amém e bom dia.

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