“In Extremis” (11) – “…cheia de flores, cheia de encanto.”

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(imagem: reprodução Pixabai)

Recentemente, uma jovem repórter de televisão perguntou-me a causa, em minha opinião, de Piracicaba ser tão cativante, sedutora à primeira chegada. Respondi-lhe ser, também para mim, um mistério.  Na realidade, porém, sei tratar-se de uma escolha humana diante das tantas maravilhas da natureza. Pois, o Povoador fora instruído a assentar o povoado em outro lugar. E, certamente, atraído mais pela beleza do que pela utilidade, escolheu instalar-se onde ele e a povoação pudessem encantar-se com as belezas do salto, queda d´água exuberante.

Somos, portanto, resultado de uma escolha, de uma opção. Nascemos atraídos pela beleza e tem sido essa, ao longo da história, a nossa vocação. Em mim, a cada encanto com que deparo, soa-me, no coração, o eco daquele prece judia – depois adotada pelos cristãos – que rende graças: “Bendito sejais, Senhor do Universo, pelos frutos da terra e pelo trabalho do homem.”  O Povoador Corrêa Barbosa mostrou-nos que a beleza está na alma humana, uma semente de encanto ancestral que desabrocha à visão da formosura. Foi pensando nisso que – honrado a deixar uma mensagem quando da renovação da Rua do Porto – emprestei, do poeta português Tomás Ribeiro, a frase do poema que imortalizou seu amor a Portugal: “Jardim da Europa à beira mar plantado.” Piracicaba é, por natureza, um “jardim à beira-rio plantado”. E, nesse jardim especial, a responsabilidade de seus moradores é de, cada vez mais, aprimorarmo-nos como jardineiros.

Ora, estamos numa era de mudanças intensas, surpreendentes, admiráveis e, também, assustadoras. É como se um furacão estivesse varrendo tudo o que existia, não deixando pedra sobre pedra. Talvez, no entanto, estejamos enganados e não consigamos enxergar horizontes luminosos. Pois o novo assusta. Piracicaba, no entanto, tem uma história magnífica de adaptação, de pioneirismo, de adequação ao rodar da vida e do mundo. Já provamos ser um povo cauteloso diante da novidade. Mas aberto e receptivo ao novo frutificante.

No livro “O Leopardo”, o Conde de Lampeduza lavrou uma frase ainda hoje repetida: “É preciso mudar sempre para continuar tudo igual.”  Isso é sabedoria porque a vida não é exclusão, mas uma inclusão selecionada. O ser humano é fruto de seu passado. Por mais vibrante seja seu presente, este resulta de tudo o que veio antes, de raízes plantadas, de princípios sólidos. Ao longo do tempo, todo corpo vivo realmente muda. Mas a essência, alma, espírito permanecem. Talvez, pois, seja esse o grande segredo de Piracicaba: uma cidade que, sendo fruto da beleza e recebendo o direito de tê-la, assume o dever de preservá-la.

Estou consciente de ser mínimo o meu tempo de fazer, restando-me, porém, a pulsão cada vez maior de falar, de escrever, de sugerir, de pensar. De minha parte, em mais este aniversário de Piracicaba, gostaria de ver a população tomar-se de energia criativa e, então, mostrar que, apesar do tempo passante, somos ainda “cheia de flores, cheia de encanto.” Seria tão simples se instituições, clube de serviço, sindicatos, organizações sociais assumissem sua condição de jardineiros. E combinássemos, todos, que cada casa teria um vasinho de flores na janela; cada loja, plantas e vasos nas portas; que voltaríamos a usar palavras gentis uns para com os outros: o bom dia, o boa tarde, com licença, obrigado, por favor. Cidade, pois, florida, culta, desenvolvida e acolhedora.

Piracicaba pode tornar real a profecia de Dostoiewski: “A beleza salvará o mundo.” É nossa vocação.

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