“In Extremis” (112) – Por quê? Para quê? Como?

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(imagem de Dani Géza, por Pixabay)

Lamento por ir-me sem resposta uma de minhas angustiantes indagações: no ser humano, maior é a inteligência ou a estupidez? E digo-o por mim mesmo, por estupidezes, tolices que já cometi. Descobre-se ao fim: viver é tão mais simples!

A vida é dom, bênção, privilégio. Logo, viver deveria ser uma rendição de graças permanente. Quando imagino a hipótese de não ter nascido, exaspero-me. A corrida dos espermatozoides em direção a um óvulo deveria ser entendida como campeonato no qual o vencedor ganharia o maior troféu: nascer como gente. Assim não fosse, por que, então, aquela corrida desesperada, a louca disputa para a vitória?

A vida é bênção, insisto. E toda ela envolta em mistérios, segredos. Parece-me assemelhar-se a um presente abrindo-se a pouco e pouco, revelando surpresas. O presenteado terá que saber o que fazer com ele. Muitas vezes, porém, é como dar, a uma criancinha, joia cintilante. Ela olha, vê, acaba jogando fora. Não tem noção de valor, de beleza, de qualidade. Pode até reclamar: “Não pedi isso.” Aquele indiferente, tolo, estúpido “não pedi para nascer”.

O que pode haver de mais sagrado, beirando o divino do que gerar um filho? Dar vida a alguém, ser “fábrica de gente”! Mas por quê, para quê os geramos? Lamentam-se os momentos de dor, mas não se agradece pelas maravilhas vividas. Nega-se ou ignora-se haja um Criador e criam-se ídolos, deuses, modelos a cada dia. Os sábios sugerem e nos convidam a amar – “amem-se uns aos outros” –  e os desalmados propõem o “armai-vos uns contra os outros”.

O que fizemos? O que estamos fazendo? Descobrimos verbos auxiliares – ser, estar, ter, haver. Mas o que somos, como estamos, o que temos? E esse terrível haver que a tudo envolve no tempo e no espaço? Haveremos o quê, de quê? Pergunto-me a mim mesmo, pois ninguém pode respondê-lo por mim. Pergunto pela perplexidade diante de inacreditáveis lições não aprendidas. E, também, não apreendidas.

A pessoa – “persona” – é a máscara. O personagem desempenha um papel, uma função em qualquer história. O personagem não é aquilo que se mostra. Ele está sendo. Ora, eu sei estar numa história – essa loucura do mundo e de um tempo – que não foi inventada, criada por mim. Mas de que sou parte, na qual cumpro um papel. Sabem, aquele “estar no mundo, sem ser do mundo?” Pois é isso. Nada mais do que isso.

Viver, porém, é muito mais do que representar, do que ser personagem.  Não se trata mais de ser isso, de ser aquilo. Nascendo, já sou: gente. Se bem pensarmos, humano é tudo o que existe, pois “húmus” é a terra. Sou parte disso, aquele animal racional. Isso é o que sou. O desafio vem do verbo estar. O estar é um “por enquanto”, a grande sabedoria. Sou para estar. Para ser e estar, preciso ter. Como, para quê, por quê?

Se nasci, sou. Se sou, hei que estar. Para estar, hei que ter. Cada dia, cada hora, cada minuto é, apenas, um “por enquanto”. Toda festa termina. E seria estúpido, estando na festa, não vivê-la enquanto dure. É tolice ir-se em busca da felicidade como se fosse algo permanente. Li, de algum autor, e não me esqueço: “Felicidade são apenas momentos de êxtase”.

Convenço-me, ao final da jornada, ser possível, sim, a “boa vida” tão ambicionada pelos sábios antigos. É um estar. Logo, um aprendizado de ser, para estar. Estar alegre, estar contente, estar triste, estar com a família, estar com amigos, estar em paz, estar à espera, estar ansioso, estar com saudade, estar amando. Enfim, estar no mundo. Basta ter a sabedoria de viver. Os simples possuem-na.

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