“In Extremis” (139) – Um deus odioso e cruel

michelangelo-the-creation-of-adam-fresco-michelangelo-museum-the-sistine-chapel-wallpaper-preview

Obra de Michelangelo, no teto da Capela Sistina, no Vaticano: “A criação de Adão” retrata o encontro do Divino e do Humano (imagem: reprodução Google)

Quando se acredita num princípio falso e busca-se viver a partir dele, as consequências, inevitavelmente, serão, também, falsas. E, mais do que isso, podem ser trágicas. Pensemos – à guisa de simples e tolo exemplo – em alguém que acreditasse numa seguinte lógica: “Todos os humanos são imortais. Pedro é humano. Logo, Pedro é imortal.” Tal estupidez levaria o seu pensador, os que o cercam, a comunidade a que, por ventura, ele liderasse, todos a uma insanidade coletiva. Pois todos os humanos são mortais. E se Pedro, ou Jair, ou Messias é humano, logo, Pedro, Jair ou Messias é mortal. Simples assim, como diria o Pazuello.

O lema que os atuais chefes estão impondo ao Brasil é falso, filosoficamente falso, teologicamente falso, logicamente falso. Eles propõem e acreditam nessa farsa: “O Brasil acima de tudo; Deus acima de todos.” Ora, quando nos referimos a TODOS, estamos referindo-nos a TUDO? TODOS abrange TUDO ou TUDO abrange TODOS? Se o Brasil está acima de tudo, isso significa estar – para quem o afirma – também acima de Deus. A premissa falsa torna-se responsável por todas as loucuras, estupidezes, males que venham a acontecer. E que estão acontecendo.

Que a população se lembre ter sido esse o lema de Adolf Hitler: “Deutschland Uber Alles” – “A Alemanha acima de tudo”. E foi o fascismo brasileiro, na esteira do “duce” italiano, que proclamou a trindade “Deus, Pátria e Família”. Acreditar é preciso em que ignorar a História é repeti-la. E como tragédia.

Há que se compreender sejam – mais do que temeridade – acinte, afronta e irresponsabilidade trazerem-se religiões, crenças e crendices a governos democráticos que, portanto, supõem a pluralidade de seu povo. A história da humanidade – tão complexa, tão ainda incompleta – é contada a partir das crenças, religiosidade, crendices de séculos sem conto. Mesmo a história do monoteísmo, de um deus único, é complexa. Para uns, é Javé; para outros, Alá; para outros mais, Deus. Nações e povos outros – em número muito mais significativos – têm diferentes vivências e fé. Trazer um deus – qualquer seja a visão que se tenha dele – ao universo da política é acreditar em poder absoluto e, portanto, em alguma forma de ditadura.

Na fria – e, para mim, então nebulosa – madrugada de 7 de julho de 1967, aconteceu-me aquele que me foi e tem sido um dos momentos culminantes da vida. Como que atingido por um relâmpago, um raio, um soco na alma – fui despertado para o divino. Aconteceu-me o nocaute do meu viver apenas racional. Entendi, então, ser possível e verdadeira aquela narrativa de Saulo cair do cavalo. Entendi e aceitei os limites de minha inteligência, a fragilidade da razão pela qual me pautava.

A partir daquela madrugada, passei a estudar ainda mais, uma busca enlouquecida para entender, para compreender. Ainda o faço, mas com humildade de aceitar que, diante do mistério, o sentir é mais importante do que o saber. Pois a verdade está abrigada no coração. E se – após tantos milênios – se acredita num deus, há que se lhe ser grato pelo amor, pela comunhão em tudo o que existe. O deus cruel, vingativo foi o do Antigo Testamento. O de Jesus Cristo é fonte do amor.

O rancor, os ódios, as desavenças, os horrores espalhados pelo Brasil só podem nascer – quando o governo fala de deus – de uma entidade cruel e odienta. Ninguém o merece. A nação tem esperança de o Deus de misericórdia, de compaixão dar-nos prudência e sabedoria para superarmos toda essa amargura. O Brasil está acima do deus de Jair Messias. Felizmente.

Para acompanhar outras crônicas desta série, acesse a TAG “In Extremis”.

Deixe uma resposta