“In Extremis” (162) – Indecência

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(foto: Jornal de Piracicaba / acesso Google)

Devo reconhecer sentir-me constrangido – até mesmo quase envergonhado – ao iniciar este texto abordando tal assunto. O mundo está em chamas. A fome, qual maldição, destrói vidas indefesas. Multidões desabrigada, também em Piracicaba, perambulam pelas ruas. Políticos irresponsáveis – eleitos por maiorias indiferentes – infestam poderes que deveriam ser ocupados por pessoas dignas. E, diante desse caos social, político e econômico – este escrevinhador abordando a violação a obras de arte?

Pois assim é. Assim tem que ser enquanto o escriba já idoso continuar, como jornalista, na sua missão de estar entre os cães de guarda da comunidade. Mesmo com meus latidos e ladrares já roucos, a responsabilidade tem que ser assumida. Pois – prosseguindo em sua sanha inconsequente – o Prefeito está tentando ludibriar o Judiciário da mesma forma como já o tenta fazer com a população. Ora, o poder político é causa – em todos os tempos e lugares – de disputas com armas nem sempre leais ou decentes. Mentiras, engodos, corrupção, traições, farsas, ilegalidades – todo esse universo de artimanhas mostra-se à luz ou se esconde nas sombras. A lição de Lord Acton permanece viva: “O poder tende a corromper, o poder absoluto corrompe absolutamente.”

O Prefeito Municipal – como que subordinado ao vereador do revólver e ao “soi disant” secretário por ele tutelado – está tentando, parece que desesperadamente, livrar-se da escandalosa ilegalidade cometida. Trata-se, ainda, da transferência – cada vez mais suspeita – da Pinacoteca Municipal. E insisto: em dias terríveis de fome, de miséria, de tragédias humanas e sociais. De minha parte, mesmo sentindo-me à beira do ridículo, “noblesse oblige”.

A indecência espanta! A questão está na infração à lei 5.194/2002, em seu artigo 90 que determina:

“A Pinacoteca Municipal Miguel Archanjo D´Assumpção Benício Dutra, criada e vinculada à Secretaria Municipal de Ação Cultural, terá o seu funcionamento em prédio próprio da municipalidade, localizado à Rua Moraes Barros, 233, centro – Piracicaba – SP.”

Sem cuidados com a legislação, sem dar satisfação aos que o advertiram da improcedência, ele desmontou a Pinacoteca – cujo prédio é tombado historicamente – deixando amontoadas as preciosas obras de arte um galpão do secular imóvel.  O incrível secretário já declarou, como se fosse fato consumado, a criação da “Pinacoteca do Povo”. Não se tratou, portanto – como, agora, o sr. prefeito tenta justificar – de medida provisória para conservação das obras. É mentira.

E é mentira confirmada, numa declaração de réu confesso. Pois o mesmo prefeito, tentando driblar a justiça, apresenta, agora, à apreciação da Câmara Municipal, um projeto que pretende simplesmente alterar a lei, safando-se, assim, da responsabilidade criminal que lhe poderá ser cobrada. A proposta é indecente: “Art.90 – “Nos termos do art. 96 da presente lei c/c art. 40 da Lei Orgânica do Município de Piracicaba, a Pinacoteca Municipal ‘Miguel Archanjo Benício d´Assumpção Dutra’, criada e vinculada à Secretaria Municipal da Ação Cultural, funcionará em próprio municipal.”

Quem é essa gente? O que pretendem fazer com Piracicaba? A Pinacoteca vir a “funcionar em próprio municipal”? Qual próprio? E se o confuso secretário resolver instalá-la no banheiro da Guarda Municipal? Ou o prefeito preferir seja num barracão próximo à Esterqueira?

A esperança é que o bom senso e o respeito à história de Piracicaba prevaleçam entre os senhores vereadores. Ou prevalecerá a insensatez do homem do revólver?

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