“In Extremis” (66) – Jornal de papel, papel do jornal

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Deixamos agosto ou agosto foi que nos deixou? Não importa. O importante é termos sobrevivido àquele mês mal afamado mas que, na realidade, deixou mudanças no ar, muito frio, na limpidez do céu e em muitas coisas. Mês do aniversário de Piracicaba e de dois dos nossos jornais, o “Jornal de Piracicaba” e a “Tribuna Piracicabana”.

Quanto a Piracicaba, escrever a respeito dela se me tornou hábito. Receio, até, que próximo do vício. A respeito, porém, dos dois aniversariantes, sinto-me em casa. Pois, para o jornalismo, nasci no “Jornal”, quando o seu diretor, Marcelo Batuíra, nem sequer havia chegado ao mundo. E vi nascer a “Tribuna” quando, há 46 anos – num 1º de agosto – o Evaldo Vicente a fundou. Tive receio, quando ele o fez, um receio de certa paternidade pois o Evaldo – aos seus 15, 16 anos – começara conosco em “O Diário”. Felizmente, porém, foram receios infundados, na carreira vitoriosa e persistente daquele jornal.

Os 120 anos do “Jornal de Piracicaba” não pertencem apenas ao veículo, nem tão só à família que o mantém há tantas décadas. O “JP” é patrimônio cultural de nossa terra caipira e do Brasil. Ou muitos são os jornais existentes há mais de um século, há 120 anos? E mantendo um respeito que se tornou histórico? Sobreviver em meio a tantas transformações é, antes de mais nada, ter-se mantido fiel aos propósitos de suas origens.

Há, agora, novos desafios em todo o universo da comunicação, desafios realmente instigantes. No entanto, é da natureza dos jornais conviver com enfrentamentos. Afirmar, com tanta certeza – como fazem alguns – que desaparecerá o “jornal de papel” parece-me precipitado. Afirmação semelhante ocorreu ao surgimento do rádio e, mais estrepitosamente, com o mágico aparecer da televisão. Agora, com o espetacular início da já chamada era digital, sombras de dúvidas caem sobre os veículos impresso, uma sombra de dúvidas. Perecerão, sobreviverão?  Ou haverão de assumir novas funções, novas responsabilidades? A internet matará livros, jornais, revistas?

O que deve desaparecer, creio eu, é o jornal de papel como difusor de notícias. Os meios digitais já assumem essa função com rapidez, velocidade admiráveis. Não há mais como duvidar disso, sendo compreensível a afirmação de que, com um celular, “o mundo está em suas mãos”. A internet é uma das mais admiráveis conquistas humanas e as gerações vindouras poderão ter, nela, a grande referência do início dessa nova era. Parece-me, porém, que o papel do jornal de papel é o de assumir um outro papel enquanto jornal: o da reportagem minuciosa, o da interpretação, o da pesquisa, o da investigação, da opinião confiável. E essa responsabilidade será fundamental para a reflexão e o entendimento daquilo que acontece com tal rapidez. Será, ainda outra vez, a convivência necessária entre a Velocidade (rádio, tevê, informações digitais) e a Profundidade (jornais, revistas, livros).

A evidência já ocorreu em outros tempos e será tolice acreditarmos que chegamos ao final das grandes conquistas. Muito ainda virá a acontecer. Mas nada conseguirá eliminar uma realidade que, aliás, faz parte de tudo na vida: quanto mais rápido, mais superficial; quanto menos rápido, mais profundo. Logo – e, ainda, em meu simples entender – os novos tempos da comunicação começam a exigir o retorno daquilo que foi essencial desde quando o ser humano se relacionou com o outro e com o mundo: competência, conhecimento, confiança, credibilidade. Jornais de papel serão cada vez mais importantes e necessários à medida que abrigarem profissionais preparados para esse novo papel dos jornais. Que, na verdade, será o mesmo de sempre, adequado a um novo tempo e uma nova humanidade. O caos das redes sociais já o exige.

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