Adeus a Ermor.

Poucas pessoas foram e fizeram tão parte de Piracicaba quanto Ermor Zambello. De minha vida pessoal e profissional, também. Pois conheci Ermor Zambello – que era amigo de meu pai, maçom como ele – ainda na minha adolescência, quando Sebastião Ferraz me acolheu no “Diário de Piracicaba” para o início da aventura jornalística. Ermor estava lá. Ao lado de figuras admiráveis como o próprio Ferraz, Joaquim do Marco, Benedito de Andrade, Archimedes Dutra, Demóstenes dos Santos Corrêa e outros, uma estirpe de piracicabanos incansáveis. E Ermor Zambello, vendo-me quase criança entre tantos gigantes, insistia em puxar-me as orelhas: “Tenha juízo, turquinho. Obedeça seu tio”, referindo-se à Maçonaria.

Quando, em 1961, fui chamado a participar da redação da Folha de Piracicaba, a ser criada, lá estava Ermor Zambello, um dos sócios daquele que poderia ter sido um grande empreendimento empresarial na área de comunicações, mas que soçobrou por divisões internas. E Ermor, ao ver-me em oposição a Luciano Guidotti – que era o principal acionista – insistia em puxar-me as orelhas: “Não falei para você ter juízo? Por que não ouve seu tio?” Bom e inesquecível Ermor, a saudade que já dói, ausência que não será preenchida.

Há poucos anos, um seminário internacional de intelectuais encerrou-se com uma conclusão melancólica: o mundo está carente de líderes, desapareceram os chamados “grandes homens”. Eles se referiam às lideranças mundiais, apagadas e medíocres, mil-anos-luz de distância de personalidades como Charles De Gaulle na França, De Gaspari na Itália, Churchill na Inglaterra, Roosevelt nos Estados Unidos, Gandhi na India. A mediocrização foi, tem sido arrasadora. E essa reflexão se torna ainda mais dolorosa ao se entender que vale, também, para Piracicaba, ou especialmente para nós, que vamos, aceleradamente, perdendo os nossos “grandes homens”. Ermor Zambello foi, sem dúvida alguma, um deles. E um dos últimos.

Confesso ter-me deprimido muito ao receber a notícia da morte de Ermor Zambello. Não se trata tão somente de me sentir desamparado num dos meus apoios morais mais generosos, no homem que conseguiu ser o conciliador e o reconciliador em todos os momentos de grandes lutas em Piracicaba. Trata-se de uma perda pessoal, de um amigo que, apesar da diferença de idades – ele, 20 anos mais velho do que eu – sabia sintonizar-se com o tempo e o espaço, por mais mutáveis tivessem sido, que sejam. E uma ironia ao mesmo tempo cruel e significativa: com toda a certeza, foi para mim que Ermor Zambello concedeu, por telefone, a sua última entrevista, na promessa que fizemos de dar-lhe continuidade nesta semana em que ele se foi.

Disseram-me que ele se sentiu mal e foi internado na quinta-feira. Conversamos, pois, na véspera. E marcamos o prosseguimento da entrevista ao lado do Raul Helú, outro admirável prestador de serviços a Piracicaba, quando tentaríamos recompor a história gloriosa e árdua do CCR Cristóvão Colombo. Foi a menina dos olhos de Ermor. Foi sua jóia preciosa e não me arrisco a dizer que um de seus amores, ao lado de Umbelina e dos filhos e netos.

Ele insistiu: “Você, então, marca dia e hora com o Helú?” Não deu tempo. Ele resistiu, duro e firme, teimoso até o fim. Mas sucumbiu. Ele era foi Ermor Zambello, o Doutor Tijolo, de teimoso, de duro de quebrar, de duro de vergar. Adeus, amigo. Que não estou mais enxergando o que escrevo, como se as letras nadassem em lágrimas.

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