Caipiras e globalizados.

Uma das mais complicadas dificuldades de Piracicaba nestes ditos tempos de globalização está na mediocridade do entendimento das coisas. Pois há quem pense o mundo, os tempos e a modernidade estejam começando com eles próprios. O passado e a história não lhes importam, mesmo porque não os conhecem. São limitações próprias de gerentes e de gerenciamentos, funções e atividades fechadas em quadrados rígidos. Administrar é enxergar à frente. Como, também, há que se estabelecer a diferença entre o homem público com visão apenas de político e o que tem visão de estadista. Desde Ruy Barbosa, já aprendemos: o político planta couves, para agora e hoje; o estadista planta carvalhos. Para sempre.

Piracicaba está em desenvolvimento novamente acelerado. Mas isso não é novo. Pelo contrário, é perigoso, pois já o vivemos em outras oportunidades quando chegamos a perdê-lo por falta de lideranças lúcidas e com espírito público. Ora, a tal e proclamada globalização também não é nova, nem para nós, nem para o mundo. O anseio global, universal nasce desde o momento em que o momento deixa a sua caverna e vê o espaço exterior. Há o infinito diante de seus olhos. Platão, no milagre da inteligência, nos deu a visão globalizada com o mito da caverna. Quando a primeira jangada singrou os mares, o homem estava em busca dessa universalidade. Na cultura, ao criar a universidade. Com Colombo, ao encontrar o Novo Mundo. Com os astronautas, pisando na Lua.

Em Piracicaba, a globalização começa com Antônio Corrêa Barbosa, o Povoador, ao preparar canoas para enfrentar o invasor espanhol nas fronteiras de Iguatemi. A globalização – que é mundialização, universalização – motivou a alma universal dos Moraes Barros, de Luiz de Queiroz. A ESALQ é o maior testemunho de Piracicaba: com suas raízes caipiras, buscou e encontrou a alma o universal.

E Piracicaba conheceu esse espírito globalizante também nos esportes, na cultura, nas artes. Hoje, quando o Brasil se preocupa com a evasão de seus grandes craques em direção à Europa e outros mercados, Piracicaba, desde a década dos 1950, já vivia essa angústia dos filhos que se vão em busca do mundo, que saem da caverna para, talvez, para ela retornarem. O Nhô Quim – esse fantástico E.C.XV de Piracicaba que continua sendo tratado como colcha de retalhos, como chinelo usado – foi um dos primeiros grandes celeiros de craques, de grandes futebolistas que deixaram o ninho para voar sob outros céus, o espírito global. Piracicaba foi isso.

Alguns nomes que engrandeceram o Brasil e o mundo, saindo daqui, para falarmos apenas em futebol: De Sordi, Gatão, Chicão, Paulinho Camargo, Gatãozinho, saindo do XV; Mazzola, o nosso Cuíca, nas peladas do Atlético e do Palmeirinha; Coutinho, do Palmeirinha, para formar a grande dupla, ainda imbatível, Pelé/Coutinho. Esses, apenas alguns, citados ao correr dos dedos no teclado.

Mas Piracicaba – com algumas lideranças que fogem às nosas raízes, ou apenas as desconhecem – quer, tolamente, imitar outros centros, modelos difusos, modismos passageiros, até mesmo de cidades maiores e vizinhas. E cai no ridículo. Um referencial assustador é a Unimep, que metodistas medíocres entregaram às mãos de um gerente simplório, Davi Barros , fascinados pela visão de mercado. Ela será apenas uma escolinha, pois perde o espírito que a fez nascer: a de uma universidade com alma regional, universidade de nossas coisas, de nossas raízes, de nossa história. Deixa de ser universidade para se tornar um centro de ensino. Qual a diferença entre Unimep e Anhanguera? Os metodistas que a comandam, movidos pela ambição mercantilista (Inspiração da Igreja Universal? Da Igreja Renascer?), já perderam o bonde da história.

Que Piracicaba não o perca. Pois há até quem queira imitar e repetir a revista Caras, aqui, no nosso umbigo da Rua do Porto, onde centenas de visitantes vêm comer, a cada fim de semana, cuscuz, peixinho frito ou no tambor, tomar caipirinha com cachaça da terra.

Ou Piracicaba desperta para uma consciência de raiz, crescendo e ampliando-se a partir de princípios e de valores próprios – ou Piracicaba será uma cidade qualquer, como tantas que existem por aí nascidas de banditismos, de espertezas e de corrupções que, fatalmente, serão punidas. Já estão sendo punidas. O momento é de seriedade nacional. E Piracicaba, desde os tempos monárquicos, sempre foi uma cidade séria.

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