O Divino e o Soldado.
Um dos valores fundamentais da vida humana é a capacidade para ver, sentir, detectar, perceber e compreender os sinais dos tempos. Na verdade, a vida e o mundo emitem sinais, como que revelando os laços indissolúveis entre o infinito e o finito, entre o sagrado e o profano. E, poucas vezes – como agora, nos tempos ditos globalizados, mas apenas economicamente mundializados – os sinais são tão claros e evidentes: há um chamamento acelerado a um mergulho nas humanidades, a um retorno a princípios que pareceram soterrados. São raízes chamando frutos de volta, o útero que imanta o gerado.
O início da Festa do Divino e as celebrações, ainda que pálidas, do 9 de Julho não podem ser vistos como simples coincidências, ou como apenas mais um longo feriado para se prolongar a festa de consumismo e de ruídos em que mergulharam o povo. A festa existe e é necessária, mas não essa loucura de aucinações, da falta de sentido, do ir-se a lugar algum. Desde os indígenas, tribos de quaisquer partes do mundo – algumas etnias ainda não contaminadas pela chamada civilização ocidental – todos os povos têm as suas festas, as suas celebrações, rituais também de memória que nada mais significam do que a preservação da própria espécie. Pois a espécie se prolonga na História e na Geografia.
O doloroso, em Piracicaba, é ver, saber, sentir, conhecer a extraordinária dimensão cultural, mística, religiosa, cívica de nossas raízes e, ao mesmo tempo, perceber como há equívocos e crueldades terríveis a partir de dirigentes públicos. Heranças, quando existem, são para ser transmitidas. Mas, antes de fazê-lo, é preciso conservá-las, preservá-las. Quantas escolas sabem do Soldado Piracicabano Constitucionalista, da morte de muitos pelas liberdades democráticas, do sangue derramado contra ditaduras? Os versos de Lagreca, quantos os conhecem ou, pelo menos, se detiveram para lê-los na pedra do Monumento ao Soldado?
Neste longo feriado, temos a Festa do Divino e a celebração do 9 de Julho. São dimensões espirituais de Piracicaba que se conjugam, como a dizer e a revelar, insistentemente, que temos motivos mais nossos para reverenciar o que tem sido esquecido até por muitos paulistas.