Relações incestuosas e povo.

Há, em política, um conceito realista mas perigoso, pois capaz de colocar por terra qualquer senso de justiça e de responsabilidade do homem público perante o povo. Trata-se de política como uma relação amigo/inimigo. Isso existe, mas há que ser ponderado nos seus exatos limites a menos que se violem todas as noções de direito e de justiça. Por tal concepção, “para o amigo, tudo”. E, “para o inimigo, nada”, ou “a lei”, como dizia Getúlio Vargas sem, no entanto, cumpri-lo.

Na última sessão camarária, o vereador Gustavo Herrmann cumpriu seu dever e pediu o afastamento do presidente da Emdhap, Walter Godoy, que foi apanhado pelo Ministério Público e Polícia Federal em conversa comprometedora com um dos chefes da chamada “Máfia das Casinhas”, um escândalo monumental que dará, ainda, muito o que discutir. Nessa “máfia”, estariam envolvidos o irmão de Barjas, Negri, Arnaldo Negri, funcionário da Secretária de Habitação ainda na administração de Barjas, com outros piracicabanos que são homens de confiança do prefeito no governo municipal. O escândalo tem rastros perigosíssimos e, por isso, tratá-lo com benevolência de amizade é um acinte e será uma afronta ao povo piracicabano.

O vereador Gustavo Herrmann pede o afastamento de Walter Godoy, apesar de “ser meu amigo”, conforme revelou. E essa questão de amizade, que Herrmann tentou superar, parece ter-se acentuado quanto ao vereador Capitão Gomes, cujos posicionamentos políticos, alguns deles pelo menos, se vão tornando cada vez mais estranhos em referência à sua apregoada independência até passado recente. Para o Capitão Gomes, não há necessidade de Walter Godoy afastar-se, mesmo sob forte suspeição e com os rastros que chegam a Piracicaba. Da mesma forma, não houve, por parte do governo municipal, necessidade alguma de a secretária da Educação, Giselda Ercolin, afastar-se, mesmo quando condenada, em primeira instância, por plágio e com dinheiro público.

A relação amigo/inimigo é realista, pragmática, mas nem sempre é marcada pela moralidade. E, hoje, o que mais se exige de nossos homens públicos – diante do cansaço e da náusea do povo brasileiro como um todo – é a retidão moral, a firmeza de princípios, a convicção sólida de que é preciso, com urgência, dignificar a vida pública. Suspeitos têm que ser afastados, quando essa suspeição nasce de indícios sólidos e palpáveis, como os que estão envolvendo não apenas Walter Godoy, mas toda uma trupe que cerca o prefeito desde os seus tempos no Ministério da Saúde e na Secretaria da Habitação.

Há relações promíscuas, até mesmo politicamente incestuosas, na administração municipal. A relação amigo/inimigo é, agora, o que menos importa, pois, quando há amigos demais sendo beneficiados, formam-se bandos, quadrilhas, as tais máfias que se espalham feito praga por toda a política brasileira. A população é o alvo preferência da ação pública; amigos, em política, podem ser comprometedores.

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