Ladice, a eterna primeira-dama

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Fábio Mendes

Ladice Salgot achava graça, nessa entrevista publicada pelo jornal eletrônico A Província em 2006, quando diziam que ela é considerada uma das mais marcantes primeiras-damas de Piracicaba. “Nunca liguei para isso, o que eu gostava era de ser mulher do Salgot”, afirma. Ela ficou 54 anos casada com Francisco Salgot Castillon, o espanhol que por duas vezes administrou a cidade. Não completou a última, cassado pelos militares.

Ladice não gosta muito de lembrar os detalhes mais duros da história política do marido, principalmente a prisão em 1974. “Às vezes acho que prefiro apagar certos detalhes”, contava. Mas não se esquece do homem carinhoso com quem dividiu a vida.

A PROVÍNCIA – O que a senhora acha de ser considerada a eterna primeira-dama de Piracicaba?

Ladice Salgot – Eu fico feliz quando lembram de mim, mas na verdade não acho isso. Nunca liguei muito para ser primeira-dama, nunca fez muita diferença. O que eu gostava era de ser mulher do Salgot.

E como era ser mulher do Salgot?

Ele era muito carinhoso. Nos últimos tempos, quando não saía mais, me via me arrumando para ir ao teatro ou à Escola de Música, dizia: ‘eu não devia deixar você sair sozinha, porque você está tão linda!” Eu achava isso tão bonito!

A senhora está viúva há quanto tempo?

Ele morreu no dia 23 de janeiro de 2002. Para não me entregar, pensei que sou filha única, tenho dois filhos, Sérgio e Lídice, que são solteiros e não me deram netos, então teria de ser forte. Deveria aceitar a viuvez sem muito choramingo pelos cantos.

Como a senhora e o Salgot se conheceram?

Foi no Rio de Janeiro, aliás as pessoas pensam que sou carioca mas nasci em Campinas e fui para o Rio com 9 anos. Tinha um amigo espanhol de minha mãe que conhecia o Salgot. O Salgot nasceu na Espanha numa cidade chamada Centellas, perto de Barcelona. Ele tinha um tio em Piracicaba, o monsenhor Martinho Salgot. Então, quando ele estudava Engenharia no Rio, esse amigo espanhol o levou para almoçar na casa dos meus pais.

Foi paixão à primeira vista?

Eu demorei para perceber o interesse dele, acho que banquei a difícil. Só percebi uma vez ao contar que fui à Escola Naval e arrumei um fã, um cadete. Aí ele ficou bravo e pensei: só pode ser ciúme!

Quando o namoro engrenou?

Começamos a namorar, mas não podíamos ir aos lugares sozinhos. Até no cinema minha mãe, Olga, ia junto. A gente assistia sempre filmes românticos como “E o Vento Levou”. Ficamos noivos num lugar muito bonito, a ilha de Paquetá.

E o casamento?

Foi no Rio mesmo, na igreja Sagrado Coração de Jesus, na Glória, no dia 5 de maio de 1948. Como meu pai, Laureano, era cabeleireiro, foi numa terça-feira porque ele trabalhava nos finais de semana.

Quando o casal veio para Piracicaba?

Em 1948. O Francisco veio antes, em 1946, recém-formado. Eu vim logo depois do casamento.

O que a senhora achou da cidade?

Gostei muito, não sei se porque quando você está apaixonada e começando uma vida nova acha tudo lindo. Mas a verdade é que a cidade é bonita mesmo, com dois pontos lindos, que são o rio e Esalq.

Como foi o começo da vida de casada?

Dois meses depois eu fiquei grávida. Francisco Sérgio nasceu em março de 1949. Quando ele fez um ano, engravidei de novo. Lídice nasceu em novembro de 1950. No fim achei bom que os dois nasceram perto pois até hoje são grandes amigos. Com as crianças mudamos para a casa da rua Benjamin.

Quando surgiu a política na vida do Salgot?

Meu marido sempre teve um lado social muito forte, ele sempre se preocupou com as condições daqueles que moravam na zona rural, no sítio, como a gente falava. Por isso ele sempre foi muito querido pelo povo. A primeira vez que foi vereador foi em 1950 pela UDN em 1950. Ele foi duas vezes e tinha orgulho de ter sido o único vereador depois eleito prefeito.

Quando ele foi eleito prefeito pela primeira vez?

Em 1960, ele tomou posse no dia 1° de janeiro e foi uma festa muito bonita. Agora, quanto ao mandato havia o seguinte: naquele tempo o antecessor definia quando ganharia o próximo. Então o Luciano Guidotti deixou o salário muito defasado. O Francisco dizia que estaria muito melhor de vida se continuasse como engenheiro.

Como era a atuação da senhora como primeira-dama?

Na verdade meu papel era só social. Eu não era tanto primeira-dama, era mulher do prefeito. Só entrei na Prefeitura duas umas vezes na vida. Mas sempre estava pronta a aparecer numa festa ou num jantar ao lado do Francisco. Na inauguração do Mirante lembro que fiquei exausta. A gente recebeu em casas várias personalidades, como Carvalho Pinto, e o Mário Dedini era muito amigo do Francisco. Nunca fui muito ativa nesse papel de primeira-dama como elas fazem hoje. Acho que isso começou mesmo com a Rosa Maluf.

E quais as lembranças da senhora do segundo mandato de prefeito?

Muito tristes, aliás nem gosto de me lembrar muito. Eu não queria que ele voltasse à Prefeitura, parecia que estava pressentindo. Ele foi cassado em 1969 pelos milicos, que nem deram explicação nenhuma, simplesmente tiraram os direitos políticos por 10 anos.

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