Tuco, um visionário de sucesso

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Divulgação

Por vários motivos, o pintor Tuco Amalfi – paulistano no registro, mas piracicabano por opção – pode se considerar um privilegiado. Há mais de três décadas vive exclusivamente da sua arte e não precisou estudar para alcançar sucesso. Intuitivo e autodidata por definição, ele se dedica à arte desde os quatro anos, quando seus rabiscos já demonstravam um talento incomum. Hoje tem um público fiel que acompanha sua arte, que não se prende a rótulos. Surrealista? Pode ser. Mas sua obra inclui desde desenhos que reproduzem insetos de forma realista até paisagens que só se encontram em sonhos ou delírios. Nessa entrevista, publicada em 2005 no site A Província, ele fala sobre os mistérios da inspiração.

A PROVÍNCIA – Como você define seu momento atual?

Tuco Amalfi – Estou chegando aos 50 anos e venho curtindo muito essa fase. Para mim qualquer fase da vida tem sempre uma coisa nova.

É um momento de maturidade?

Não diria que é só isso. Quando você está fazendo arte, seja com quatro, quando comecei, ou com 50 anos, como agora, está sendo maduro porque está fazendo o que gosta. Meus trabalhos estão sempre de acordo com o momento que estou vivendo.

Você está se voltando só para o presente?

Eu diria que estou sempre em sintonia com o aqui e agora, vivendo intensamente o momento. Mas não deixo de prestar atenção em tudo o que está acontecendo.

E toda essa loucura que está acontecendo influencia seu trabalho?

Pois é, acho que chegamos num momento de caos. Quando a humanidade chega a um estado assim, a tendência é melhorar, pois o homem aprende por meio do caos. Será que teremos que destruir a Amazônia para lembrar que a natureza é essencial?

Num quadro, “Lembranças de um rio”, você destaca isso em relação a Piracicaba…

Exato. Mostro o rio com um peixe fossilizado. Será que o peixe precisa virar fóssil para que as pessoas deem valor?

E piora porque as pessoas não estão acreditando mais em política…

Mas o momento político está muito confuso, ninguém consegue entender direito. Eu não acredito mais em solução coletiva, acho que tem de ser individual, cada um se encontrando dentro de si mesmo.

Voltando então a sua arte, você sempre foi autodidata?

Nunca tive aula com ninguém. Fui buscando as coisas, encontrando por mim mesmo. Por isso, não acredito muito em faculdade.

Quando você começou a pintar?

Até onde me lembro, com quatro anos de idade. Fui canalizando de maneira intuitiva meu talento, sem me voltar para nenhuma escola definida.

Quando aconteceu a primeira exposição?

Foi aqui em Piracicaba, no Salão de Arte Contemporânea de 1970, e já chamei a atenção, tanto que levei um Prêmio Aquisição. No mesmo ano me mudei para cá. Mas a primeira individual aconteceu em São Paulo em 1972, no Conjunto Nacional.

Quais são suas maiores influências artísticas?

Conheço bastante o surrealismo, mas não diria que sou um surrealista. Já gostei muito de Salvador Dali, hoje nem tanto.

Seus quadros expressam um momento interior seu?

Às vezes é isso, às vezes eu pinto inspirado por uma música, ou então me inspiro na relação que estou vivendo com uma namorada. Eu vou captando e transformando em arte, sem me preocupar com rótulos.

Acha que Piracicaba valoriza o seu trabalho?

Eu não sou de reclamar e nem devo, porque acho que a cidade valoriza, sim. Você vê nas minhas exposições um público bem diversificado, de várias idades e de níveis sociais diferentes. Acho que é porque meu trabalho reflete meu mundo interior, mas não é uma coisa egocêntrica, é uma coisa cósmica.

Dá para viver apenas de pintura?

Eu consigo viver, apesar dos altos e baixos.

Quanto tempo você leva para pintar um quadro?

Depende, pois há alguns mais cheios de detalhes. Mas eu diria um tempo médio de 20 dias.

Nos anos 80 você fez várias capas famosas para a revista Veja. Por que parou?

Por que acho que o que mudou mesmo foi o estilo de fazer jornalismo. Hoje é tudo muito mais rápido, eles decidem uma capa de um dia para o outro. Até chegaram a me pedir, mas sempre queriam ‘para ontem’. Mas foi muito legal, até hoje as pessoas lembram, principalmente aquela capa do Pantanal.

Já tentou carreira fora da cidade?

Eu estou em Piracicaba há 36 anos mas nasci em São Paulo e tenho uma boa relação profissional lá. Nos anos 90 passei um tempo nos Estados Unidos mas não tive vontade de ficar. Acho que precisei ir para lá para descobrir que sou totalmente brasileiro. As pessoas que eu gosto estão aqui, preciso fazer a minha vida aqui.

O que te atrai no país? O calor humano?

Isso também, porque lá as pessoas são mais frias. Mas é também a natureza. Sou um crítico feroz da destruição da natureza, acho que isso é um suicídio coletivo.

Já pensou em seguir outra profissão?

Eu também me considero músico amador, pois toco viola de 10 cordas e sou muito ligado em música. Aliás, muitos dos meus quadros nasceram influenciados por sons, principalmente de jazz ou música indiana. Uso a música para pintar, para mim as duas artes já estão meio fundidas.

Para você, a arte é um meio para atingir a beleza?

Depende, pois a linha entre a beleza e a feiura é muito tênue, é difícil de explicar. Por exemplo, você pode achar uma metrópole bonita, mas eu posso achar que tudo aquilo é uma poluição visual. O que é mais bonito, o campo ou a grande cidade? Eu acho que há momentos que você precisa de um e momentos que você precisa de outro.

E o que você acha que Piracicaba tem de bonito?

Há coisas muito evidentes, como o rio, a rua do Porto, a Esalq. Também gosto muito da zona rural, principalmente a região de Anhumas. Eu já estou aqui há muito tempo, já me considero piracicabano.

Dizem que artista tem dificuldade de levar a vida cotidiana. Para você isso acontece?

Não acho, pelo menos não é tão evidente. Atualmente estou separado e tenho três filhos, Thiago, Suzana e Sabrina, que é a mais velha e está fazendo faculdade de Biologia em Santos. Acho que eles percebem que o pai é um pouco diferente dos pais dos amigos, pois eu não tenho rotina, mas eles levam isso numa boa.

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