Superstições e crendices do caipira paulista (1)

Os moradores das grandes cidades talvez não saibam o que seja picumã. Os caipiras do interior sabem. Picumã são fios de teia de aranha enegrecidos pelo fogo, fios de fuligem negra, nome que se estendeu, também, à fuligem de fogões de lenha, ciscos de cana queimada, etc.

Se o homem urbano desconhece picumã, há que se imaginar o que pensaria ele diante de uma mistura de picumã com teia de aranha. Para que serve? Caipiras sabem: é um excelente remédio para curar feridas… E mais: ainda há quem sugira, às parturientes, essa estranha pomada para aplicar no umbigo dos recém-nascidos.

São superstições, crendices, benzeções que, mesmo nos tempos de uma propalada “aldeia global” e com todos os recursos das mais sofisticadas tecnologias, ainda existem entre os paulistas do interior. Em Piracicaba, apesar das grandes transformações tecnológicas, até famílias tradicionais mantêm superstições e crendices que transmitem de geração a geração.

Da fecundação

As práticas dessas superstições, nas tradições populares paulistas, vão-se transformando, agora acrescidas das crendices de outras regiões brasileiras, fruto dos grandes surtos migratórios. No entanto, estudiosos do folclore paulista – como Amadeu Amaral e Alceu Maynard de Araújo – fizeram o registro de muitas delas. As da fecundação, por exemplo. O problema é abusar-se das fórmulas. A isso, dá-se o nome de “abusão”, que pode fazer mal ou complicar a vida de quem abusa.

O caipira diz ter remédios tanto para fecundar como para auxiliar no nascimento.

Contra a esterilidade

Se a mulher não tem filhos, o caipira procura uma anta macho, caça-a, arranca-lhe o órgão genital e põe o couro do dito cujo órgão para secar. Depois de seco, faz-se uma infusão desse couro e dá para a mulher estéril beber durante alguns dias.

Na véspera de São João, deixa-se um copo d´água ao relento, no qual se deve lançar uma clara de ovo. No dia seguinte, a mulher estéril vê a figura que se formou na água e, se for de gente, sorve o líquido devagarzinho, durante três dias.

O “abusão”, nesse caso, pode ocorrer se a mulher, por exemplo, colocar na água duas claras de ovo ou ovos duplos. Pode vir a ter gêmeos.

Gravidez e parto

Para se saber se uma mulher está grávida, os caipiras ficam atentos ao marido dela: toda vez que um homem tem dor de dente é porque a mulher está grávida. Isso é importante porque, assim, fica mais fácil prevenir quanto aos cuidados que a mulher deve passar a tomar. Por exemplo: grávida não deve olhar para pessoas com defeito físico ou mesmo para as fotografias delas.

Se olharem, o filho nasce com o mesmo defeito. Não se deve , também, olhar para coelho ou lebre: o filho pode nascer com orelhas grandes ou com lábio leporino.

Num parto difícil, nada, para o caipira, é tão eficaz quanto a mulher engolir três caroços de feijão mulatinho. Ou, então, vestir a camisa do marido pelo avesso e, também, se ele tiver chapéu, usá-lo também pelo avesso. Alguns caipiras, diante de partos mais difíceis, usam outra fórmula: sentam a parturiente numa cadeira sem fundo e, sobre a barriga dela, colocam o chapéu do marido, fazendo rezas. O “abusão” pode acontecer se a reza for muito forte: daí, todas as dores passam para o marido.

Se nenhuma dessas simpatias der certo, quer dizer que a “barriga está encruada”. Nesse caso, não há outra saída senão colocar, sobre o ventre encruado, uma imagem de São Benedito.

Quanto à gravidez e partos, há que se tomar cuidado se o casal já tiver seis filhos homens, sem nenhuma menina entre eles. Corre-se o perigo de o sétimo filho, se for também homem, tornar-se lobisomem quando adulto. E se a sétima gravidez for de menina, a infeliz irá, quando adulta, transformar-se em bruxa ou numa porca grande e brava que, acompanhada de 14 leitões, ficará solta na estrada, atacando forasteiros.

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