Superstições e crendices do caipira paulista (2)

Os moradores das grandes cidades talvez não saibam o que seja picumã. Os caipiras do interior sabem. Picumã são fios de teia de aranha enegrecidos pelo fogo, fios de fuligem negra, nome que se estendeu, também, à fuligem de fogões de lenha, ciscos de cana queimada, etc.

Se o homem urbano desconhece picumã, há que se imaginar o que pensaria ele diante de uma mistura de picumã com teia de aranha. Para que serve? Caipiras sabem: é um excelente remédio para curar feridas… E mais: ainda há quem sugira, às parturientes, essa estranha pomada para aplicar no umbigo dos recém-nascidos.

São superstições, crendices, benzeções que, mesmo nos tempos de uma propalada “aldeia global” e com todos os recursos das mais sofisticadas tecnologias, ainda existem entre os paulistas do interior. Em Piracicaba, apesar das grandes transformações tecnológicas, até famílias tradicionais mantêm superstições e crendices que transmitem de geração a geração.

Inimigos das crianças

A preocupação com as crianças prossegue especialmente na primeira infância. Vários inimigos estão à espreita: a cuca (uma bruxa), o lobisomem, o bicho papão, o saci, gênios malfazejos.

A cuca está sempre faminta e gosta de bons vinhos, razão porque ela bebe o sangue das crianças não batizadas. Para evitar tal tragédia, as mães devem, enquanto não batizam seus bebês, deixar uma vela acesa a noite toda no quarto e, sob o leito do bebê, uma tesoura aberta em forma de cruz. Nos últimos tempos, o caipira, a essa prática, tem juntado, também, ramos de alecrim e de arruda, “bem-feito” de origem portuguesa.

O bicho-papão é o masculino da cuca, um bruxo feio e também faminto. Para espantá-lo, há diversas canções que devem ser entoadas pelas mães ou familiares. Além disso, o bicho-papão pode ser afastado com algumas fórmulas para desfazer o “quebranto” que, geralmente, dá em criança forte, gorda e bonita. Estas causam inveja aos pais que têm filhos feios e, então, começam a murchar, a definhar. Quando isso acontece, houve “quebranto”. Nesse caso, coloca-se uma figa no pescoço da criança.

Apesar de tantas fórmulas, superstições, crendices, benzeções e recursos ditos milagrosos, os caipiras não abrem mão da maior proteção que conhecem para as suas crianças: pedir ao Anjo da Guarda. Cada criança caipira tem o seu e toda a família reza para ele.

Cura pela natureza

Que se não confunda a Piracicaba dos condomínios, dos chamados “bairros nobres” com a Piracicaba de bairros, da periferia, do chamado “povão”. Esse, o “povão”, é a grande maioria e que conserva as raízes afro-indígenas mescladas a valores de culturas imigratórias. É uma Piracicaba encantadora, de uma população rurbana (rural e urbana) com uma filosofia de vida singular, movida pelas inovações tecnológicas mas com os pés fincados nas mais antigas tradições. É ela a dona da chamada medicina popular vinculada à generosidade da natureza. Eis algumas das incontáveis prescrições.

Males dos rins: abacateiro, agrião, alecrim, quebra-pedras, urtiga e muitas outras, incluindo a “poderosa lágrima-de-nossa senhora.

Reumatismo: arruda, canela, pau-d´alho, sassafrás, manacá, e diversas outras.

Pulmões: xarope de eucalipto, abacaxi, abóbora, agrião, mastruço, etc.

E, enfim, solução para todos os males. A procura desses recursos em farmácias especializadas é cada vez mais frequente pelas classes mais abonadas.

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