Folia do Divino

festa do Divino

Festa do Divino, no Rio Piracicaba. (foto: Fran Camargo)

Que o perdão seja sagrado, que a fé seja infinita
Que o homem seja livre, que a justiça sobreviva
(Ivan Lins e Vitor Martins)

A Festa do Divino, desde as suas origens no século 19, está na alma dos piracicabanos que, em espírito de fé e de celebração folclórica, mantêm uma tradição que remonta aos portugueses. Ela nasceu do espírito religioso de nossos antepassados, quando Igreja e Estado estavam unidos, ainda no Império. Em Piracicaba celebra-se, talvez, uma das últimas procissões fluviais.

Foi na Rua do Porto, em 1826, que a festa nasceu, por iniciativa de José Viegas Muniz, realizando-a na água. Anteriormente, os festeiros (Comissão da Igreja) e seus auxiliares, o Alferes da Bandeira e os mordomos faziam-na em terra. Os festeiros e o padre, saindo do Largo da Matriz (Catedral) iam até a Rua do Porto, à altura da Olaria de Elias Cecílio. Entravam, então, nos batelões, nas barcaças e canoas, formando as Bandeiras. Uma ia rio acima, outra esmolando rio abaixo, arrecadando prendas, para o leilão: frangos, novilhas, leitões, dinheiro.

Com bênçãos e missas, a Festa saudava o Divino Espírito. Mas, à noite, com catira, cateretê, umbigada, cururu, comilanças e muita bebida, acontecia a Folia do Divino, toda profana. O cururu foi introduzido por Mário Lordelo, em 1933. O folclorista Alceu Maynard de Araújo considerou, em análise feita no Almanaque de Piracicaba de 1955, a Festa/Folia do Divino, “uma das mais belas que existem”.

O autor deste livro resgatou um dos cantos de agradecimento feitos pelos “marinheiros do Divino”. Com caixa, triângulo e viola, eles cantavam: “Deus le pague a boa esmola/ dada de bão coração/ no reino do céu se veje o sinhô e sua geração.”

Ainda agora, em pleno século 21, a modernidade e as ansiedades de um tempo marcadamente materialista não conseguiram sepultar esse patrimônio cultural dos piracicabanos, muitas vezes envolvendo conflitos entre o clero e os leigos. Nem mesmo quando, na década de 1960, a Igreja Católica tentou coibir os festejos em suas demonstrações profanas, a Festa do Divino se interrompeu.

Foi durante o epicospado de D. Aníger Melilo que a Igreja negou chancelar a festa, considerando-a muito mais folclórica do que religiosa. Com o mesmo bispo, no entanto, houve a revisão das celebrações. Vitória de Piracicaba, onde a Irmandade do Divino, guardiã da festa, se renova geração após geração, mantendo raízes do passado.

[Estes conteúdo e imagem foram retirados do livro “Piracicaba, um rio de passou em nossa vida”, de Cecílio Elias Netto. Saiba mais sobre esta e outras obras publicadas pelo ICEN.]

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