Em 1987: Piracicaba ainda quer o XV?

O texto abaixo foi publicado em junho de 1988  no semanário impresso A Província.

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A direção do XV de Novembro deu, semana passada, o gritro de alerta: as fracas rendas estão inviabilizando o clube economicamente. Os dados são incontestáveis: a média de público nas partidas em Piracicaba é de 2455 torcedores; fora de casa a média tem sido de 4092 pessoas. A renda líquida média é de Cz$245 mil, enquanto apenas o bicho, em caso de vitória, chega a Cz$ 330 mil por partida. Nas partidas contra os chamados times pequenos, a média de renda cai para Cz$ 153 mil.

Em entrevista ao “Jornal de Piracicaba”, o vice-presidente do XV, Marinho Pacheco Fernandes, declarou que o time é “relativamente barato (folha de pagamento mensal em torno de Cz$ 1.500 mil), se comparado a outras equipes, mas não pode sobreviver com estas fracas rendas, assim como dificilmente teria condições de contratar bons jogadores, criar uma sede própria”. E indagou-se sobre “se uma cidade como Piracicaba, com mais de 350 mil habitantes, onde ficar tanto tempo sem futebol”, referindo-se à virtual paralisação das atividades do XV, após o término do Paulistão.

A queixa dos atuais e ex-diri gentes esportivos quanto a um aparente desinteresse da cidade para com as modalidades em geral e o futebol em particular é antiga. Vários fatores são apontados para explicar esse fenômeno, que não se restringe a Piracicaba. Pelo menos um alcança o consenso: o futebol tem se tornado um esporte caro. Os clubes, com raras exceções, abandonaram a preocupação de formar as chamadas “pratas da casa” fruto de um trabalho educativo e de massificação através das escolinhas. Parte-se, então, para a compra das “estrelas”, o que eleva os custos à estratosfera. A crise econômica, a ingerência política e os hábitos culturais ditados pelos meios de comunicação também acabam colaborando para afastar o povo dos estádios. Existem alternativas para essa situação? O que fazer para cobrir o abismo entre o XV de Novembro e a cidade?

CAUSAS DO  DESINTERESSE 

Presidente do XV entre 1972 e 1973, Gustavo Jacques Dias Alvim constata que a “frieza da cidade” para com os esportes em geral é histórica. Atual presidente da Associação Desportiva Unimep, reclama das dificuldades em ampliar o corpo associativo. “A cidade cobra resultados, mas não ajuda”, desabafa.

Gustavo Alvim acredita que alguns elementos contribuíram para essa situação. Um deles, a dependência do clube exclusivamente da figura do presidente, verificada em boa parte da história do XV, primeiro com Humberto D’ Abronzo e depois com Romeu íÍtalo Ripoli, por temperamento “centralizador”.

Por outra parte, Gustavo Alvim considera que, por viver em uma cidade rica, aburguesada, o piracicabano classe média tem várias opções de lazer, como ranchos, casas de campo, clubes e mesmo facilidades para ir à praia, e ele acaba não se ligando ao esporte.

Enquanto isso, “o povão, que teria no esporte uma de suas únicas opções de lazer, encontra barreiras enormes, em razão da crise econômica”. Acha que o preço dos ingressos, cada vez mais elevado, está afastando ainda mais o público. “A pessoa geralmente não vai sozinha, quer levar o filho ou um amigo, elevando os seus gastos”. Não despreza a concorrência desleal da televisão, mas lembra que, em 72-73, quando era presidente do XV, “a TV não tinha tanto alcance e a situação era mais ou menos a mesma”.

Prata da Casa

Para Gustavo Alvim, a saída para aumentar o interesse da cidade pelo XV e o esporte em geral é fazer um trabalho dirigido à infância e juventude. Cita o exemplo da Adunimep, que mantém escolinhas de basquetebol e adota política de distribuição de ingressos gratuitos para crianças nas escolas onde estudam. “As crianças vão de graça, mas um ou outro parente acaba indo, o que colabora para aumentar o público e a renda”. Gustavo conta que tem lutado para a não-majoração dos ingressos do basquete, pois “é preferível ter um grande público com uma renda xis, do que ter essa mesma renda xis com um público menor”.

O jornalista Delphim Rocha Neto concorda com a tese de Gustavo: é preciso investir e logo na nova geração. Presidente de honra do XV de Novembro, lembra que o clube já chegou a ter sete faixas de jogadores, do infantil ao time principal. Em 1948, quando o XV de Piracicaba foi o primeiro campeão do torneio criado pela Lei do Acesso, dos 22 jogadores do plantel, 18 eram naturais da cidade — hoje, o número de piracicabanos no XV é desprezível.

Rocha Neto também reclama da desorganização estrutural do futebol brasileiro. ‘ ‘Quando terminar o Campeonato Paulista, os grandes clubes vão disputar o Brasileiro, e os pequenos ficarão ao léu, sem rendas e com dívidas”. Para ele, ou acontece “uma mudança geral, ou em dois anos os clubes do interior estarão na miséria”. A permanecer a atual situação, acha melhor que “terminasse o futebol profissional no interior”. Observa que os clubes que estão alcançando os melhores resultados hoje são exatamente aqueles que investem nas “pratas da casa” e, portanto, têm um gasto menor, como o XV de Novembro de Jaú.

Cético, Rocha Neto entende que, ‘se a cidade não colabora com uma diretoria liderada por um homem de bom senso como o Celso Silveira Melo, o que se pode esperar?”. E nota que a Prefeitura Municipal ‘ ‘nunca ajudou tanto o XV como agora”

Ex-técnico e vice-presidente do XV, Rubens Leite do Canto Braga compartilha da opinião de que é necessário aplicar na “prata da casa”. Do contrário, continuaremos a ver espetáculos proporcionados equipes caríssimas, formadas por pessoas de fora, enquanto o piracicabano mesmo não pratica esportes”. Observa, como Rocha Neto, que ”as melhores escalações do XV eram formadas por uma maioria de atletas de Piracicaba. Depois, quando o número de jogadores piracicabanos diminuiu, a luta passou a ser não cair para a segunda divisão”.

Rubens Braga acha que o prefeito Adilson Maluf poderia “ter plantado e já colhido os frutos de um trabalho de base’”, e lamenta a interferência dos interesses políticos no esporte de maneira geral. “Não é raro um grupo contrário ao que está no poder ficar torcendo para que a equipe vá mal”, conclui, em tom de amargura.

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