Fazer tricô: terapia e vantagem econômica

O texto abaixo foi publicado em junho de 1988  no semanário impresso A Província.

trico

No começo, Ana começou o tricô por diversão. Ela via sua mãe tricotar as blusas e não se preocupava em aprender. Um dia, conta, pegou as duas agulhas e um novelo de lã e fez alguns pontos. Gostou. Fez um cachecol por ser fácil, depois: um par de polâinas. “Fiquei e comecei a mostrar para minhas amigas. Pediram que fizesse para elas também. Foi uma festa”, diz.

Ana Maria da Conceição Gomes, 26 anos, hoje é uma “tricotadeira” habilidosa. Faz qualquer coisa com duas agulhas de tricô. É capaz de tirar qualquer modelo das revistas especializadas. Tornou-se uma profissional do tricô.  “A gente nem imagina o que é capaz de  fazer no tricô. Eu pensava que era uma chatice, ficar fazendo uma blusa, ponto por ponto. Hoje, eu adoro”.

As roupas, Ana faz só por encomenda. “Tricô é um trabalho que você demora para terminar. Não é como cortar um pedaço de pano e costurar. Você tem que trabalhar com o novelo de lã, e se não ficar bom tem que desmanchar tudo. Não adianta querer remendar, porque o trabalho fica horrível”.

No bairro onde mora, na Paulista, diz que é muito conhecida e garante que toda a vizinhança tem pelo menos uma peça de tricô feita por ela. E o trabalho aumenta agora no inverno. “Eu tenho tanta encomenda que fico o dia inteiro tricotando. O bom é que esse trabalho, além de me ajudar financeiramente, é também uma terapia. A gente esquece dos problemas da vida”.

O preço de uma blusa de tricô, segundo Ana, varia. Ela cobra, em média Cz$ 2.000,00 uma blusa trabalhada (ponto trança, por exemplo), quando não é ela quem compra a lã.

“Eu aconselho as pessoas a aprenderem fazer tricô. É um trabalho agradável, que pode ser feito à noite, enquanto se está assistindo televisão”.

Professora por prazer 

Maria José de Jesus é uma senhora simples, educada pela mãe para cuidar dos filhos, da casa, do marido. Ela aprendeu a costurar com 14 anos e logo depois a fazer tricô e crochê. Garante que a educação que recebeu foi rígida e que “tudo o que me foi ensinado utilizei na minha vida”.

Porém, o que ela mais gosta de fazer é o tricô. “Eu gosto. Não dá para explicar melhor. O tricô é algo que faço e me sinto bem em fazê-lo”, frisa. Maria José fica mais contente ainda quando uma de suas netas pede: “Vó faz uma blusa prá mim”. Lá vai ela, comprar os novelos de lã e fazer a blusa da netinha.

As filhas de Maria José nunca se interessaram em aprender o tricô, nem o crochê. “Elas tinham a mãe para fazer para elas. Tudo o que minhas filhas pediam eu fazia”. O enxoval das filhas, por exemplo, é todo trabalhado com biquinhos de crochê, tem almofadas, toalhas para mesa e muitos enfeites. Quem se interessou em aprender trabalhos manuais, como conta Maria José, é uma de suas sobrinhas. “Ela vinha na minha casa e ficava olhando, com olhar de interrogação. A mãe dela não aprendeu tricô, então ela não tinha como aprender. Aí resolvi ensiná-la. Sabe que a menina aprendeu rápido?”

E quem está aprendendo a fazer tricô é a professora Silvana Maria Pereira. Ela dá aula para alunos do ginásio, no período da manhã e tem praticamente a tarde livre. E seguindo o conselho de uma amiga resolveu aprender a fazer tricô. Já faz um ano que ela está tendo aulas e fez três blusas de frio para os filhos e está terminando uma blusa para o marido. “Eu nunca pensei que fosse gostar de tricô”.

Durante o verão que passou, Silvana tricotou duas blusas para ela, com linhas de algodão. Fez sucesso entre as professoras do colégio onde leciona. “Uma amiga disse que pagaria para fazer uma blusa para ela. Eu fiz”.

Silvana não pensa em fazer do tricô seu “ganha pão”. “Eu fui aprender, gostei, mas vou fazer apenas para minha família. As blusas de inverno estão tão caras que não compensa comprar. Com mil cruzados eu compro lã e faço uma blusa para minha filha. Se eu fosse comprar, ia pagar uma nota”.

Trico-terapia 

Cristina Rodrigues trabalha como secretária de um consultório médico e garante que em determinados períodos do dia, fica sem fazer nada. Nestas horas, ela acabava fumando, enquanto lia uma revista. Mas o cigarro estava fazendo mal para ela, agravando a bronquite alérgica que tem desde criança. O remédio foi parar de fumar.

Mas ficar ociosa durante algumas horas do dia estava deixando Cristina meio maluca. “Antes, pelo menos, eu tinha o cigarro. Depois que eu parei de fumar não sabia o que fazer”. Resultado: recorreu a uma amiga que faz tricô e pediu que lhe ensinasse. “Hoje eu faço tricô. Faz pouco tempo que aprendi. Agora estou terminando uma blusa para mim e meu namorado já está me cantando para fazer uma para ele”.

Para Eunice Carvalho, o tricô no início era uma forma de passar o tempo, produzindo alguma coisa. “Eu não consigo ficar parada. Sinto-me uma inútil ficar em frente da televisão, o dia passa e você acaba não fazendo nada”. A solução que ela encontrou foi fazer tricô. Hoje ela nem sente que está em frente da televisão e o dia está passando. “Eu estou fazendo coisa. Não estou parada”.

E a produção de Eunice é tão grande que está pensando em montar uma mini-escola em sua casa para ensinar tricô. “Eu estou pensando em reunir algumas amigas, formar um grupo pequeno para ensinar o que eu sei”.

Agora, quem pensa que tricô é coisa de mulher está muito enganado. Pelo menos, é o que pensa Carlos de Andrade, engenheiro civil. Filho de estilista, Carlos sempre esteve “por dentro” da moda. Aprendeu a costurar e fazer tricô. “Eu já fiz uma blusa para mim”, revela. Carlos só não fica “em cima” do trabalho de tricô. Faz quando dá tempo, quando está em casa sem fazer nada”.

Sua atenção, atualmente, está voltada para a esposa. “Ela quer por toda lei aprender tricô. E quem vai ensiná-la sou eu”, diz todo orgulhoso.

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