A vida feliz e serena no Mosteiro da Imaculada Conceição

O texto abaixo foi publicado em abril de 1988 no semanário impresso A Província. Preservamos datas, idades, comentários e gramática originais do texto.

most2

Uma vida simples e oculta. De se prender e se doar inteiramente a Deus. Vida de clausura. Assim é a dedicação das sete irmãs enclausuradas que moram no Mosteiro da Imaculada Conceição, no bairro de Vila Rezende. Louvar, agradecer e pedir a Deus pelas pessoas é a finalidade da vida dessas irmãs. O sustento vem com a produção de hóstias para toda a Diocese, com a restauração de imagens e também a confecção de terços e Agnus Dei.

Da Ordem da Imaculada Conceição, fundada há mais de 500 anos por Santa Beatriz da Silva, na Espanha, as primeiras irmãs, originárias de um convento de São Paulo, chegaram a Piracicaba em 1956 fundando o Mosteiro em Piracicaba.

“Nossa vida é exclusivamente oração, penitência e clausura”, afirma Irmã Celina, madre superiora. A dedicação a Deus começa cedo. “Levantamos às 5h15 todos os dias e já vamos fazer a Oração do Ofício Divino”, que seriam recitações de salmos para o povo, pelas famílias. Preces e hinos “em nome da humanidade, pelos que não sabem rezar, pelos que não podem e também, aos que não querem”, comenta a Madre, explicando que o Ofício é dividido diariamente em sete partes, cada uma com duração de cinco a dez minutos.

Durante o dia, as sete irmãs, sendo três de Piracicaba, três de São Paulo e uma de Minas Gerais, trabalham nos afazeres de casa e na produção das hóstias. “Por mês produzimos de 250 a 300 mil partículas de pão, e 2 a 3 mil hóstias propriamente dita, que são vendidas para toda a Diocese da região: Piracicaba, que é a sede, e também Capivari, Rafard, Santa Bárbara D’Oeste”, diz a Irmã Celina. Outro sustento para o Mosteiro é a confecção de terços e Agnus Dei, vendidos na portaria do local, além de restaurações, consertos e pintura em imagens. “Estamos a serviço da Igreja e não repartimos nossa vida com crianças e idosos, como fazem outras irmãs”, completa.

Pessoas realizadas 

Cada Mosteiro tem sua vida, “é autônomo um do outro, mesmo sendo da mesma ordem”, fala a Irmã. “De dois em dois anos, existe sempre um encontro entre os Mosteiros da Ordem da Imaculada Conceição, que ao todo, no Brasil, são 17, com palestras e ensinamentos”. Só assim é que as irmã podem sair da clausura ou, então, quando realmente precisam de tratamento médico, comenta Madre Celina. “Saímos para fazer exames ou uma operação. Para consultas, geralmente os médicos costumam vir até aqui”. As compras da casa ou até mesmo coisas pessoais para as irmãs são sempre feitas por pessoas amigas do Mosteiro. “Piracicaba tem um povo muito bom”, finaliza a simpática Irmã.

A clausura é bem diferente do que pensam as pessoas. “Não existe a estória de que não olhamos para a cara das pessoas ou que andamos de cabeça baixa e fazemos penitência de morrer de fome. Vivem distorcendo a nossa vida”, afirma a Madre Superiora. “Embora exija muito da pessoa, muita maturidade, é deslumbrante ser uma irmã enclausurada. Somos felizes, livres, serenas e maduras. Pessoas realizadas e não desiludidas”, ressalta.

Se não existem muitas vocações para a religião hoje em dia, a Irmã aponta como principal causa “o grande número de lares desfeitos prejudicando a formação das pessoas, e também a liberdade que está sendo dada a elas de um modo geral”. Madre Celina sente que as pessoas rezam, hoje, apenas para pedir, pedir, e nada de agradecer. “Nesse mundo consumista, o que vale para as pessoas é ter a liberdade”, justifica.

Irmã Celina conta que, para uma moça querer ser uma enclausurada do Mosteiro, deve ter em mente que é uma vida de muito sacrifício e penitência. Muita responsabilidade, maturidade e equilíbrio emocional. Não pode misturar carência afetiva ou traumas com a seriedade da religião, explica. “Jamais aceito aqui uma mocinha que esteja desiludida por ter brigado com o namorado”. Outra restrição da Irmã é com relação à idade: tem que ser maior de 18 anos, e no máximo, 35 anos.

“Só um aperto de mão” 

Com 62 anos de idade, a Irmã comenta, com alegria, que já se passaram 39 anos de clausura. “Nem percebi o tempo. Passou rápido”. Há mais de 10 anos é madre superiora, esclarecendo que é a única do Mosteiro que pode receber visitas das pessoas, mas sempre por detrás das grades. “As outras irmãs só aparecem para os parentes e, também, por detrás das grades. Contato físico não existe. Só um aperto de mão. Até mesmo nas missas temos nosso lugar separado por grades”, explica a Irmã. Continuando, diz que somente duas vezes por ano que outras irmãs podem ver e encontrar com as pessoas: na festa de Santa Beatriz e na data da fundação do Mosteiro. “É por isso que as pessoas devem ter muita formação para querer seguir a vida religiosa”, ressalta.

Como superiora, Madre Celina governa todo o Mosteiro, inclusive o dinheiro conseguido com trabalho delas, mas jamais dá um passo sem consultar as outras irmãs. “O espírito de união para com as outras irmãs sempre existe”, afirma.

Outro dever como Madre é ler os jornais e revistas e somente comentar para outras os assuntos mais importantes. Finalizando, comenta que através das visitas que recebe fica sabendo um pouco do mundo “As pessoas chegam aqui e contam muito para mim. Ao contrário do que muitos pensam, não somos ignorantes do mundo. Sabemos de tudo, mas sem pormenores inúteis”.

As grades mantêm a separação. O repórter sai, as irmãs ficam. E por mais estranho que pareça, o mundo delas e o nosso é o mesmo.

 

Deixe uma resposta