Rachel de Queiroz depõe sobre a grande atriz piracicabana

lyson Gaster

Lyson Gaster: uma das pioneiras do teatro mambembe. (foto: acervo “A Província”)

Durante muitos anos ela foi pouco reconhecida. Somente nos anos 80, com uma publicação de Waldemar Iglésias, que motivou recentemente uma grande reportagem em “A Província”, a vida e obra de Lyson Gaster, uma piracicabana tida e havida nos meios teatrais como uma pioneira no teatro brasileiro, começou a ser mais conhecida. Hoje, até mesmo uma tese que começa a ser desenvolvida na UNICAMP se volta ao estudo desta figura.

Muito haverá ainda a se descobrir, a se conhecer, a se estudar de sua obra. Abaixo, publicamos a opinião de ninguém menos que a escritora Rachel de Queiroz sobre Lyson Gaster, em depoimento prestado a Waldemar Iglésias, em julho de 1982.

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“Pode-se considerar Lyson Gaster como uma das pioneiras do teatro ambulante – aquelas pequenas companhias, troupes e até dues e trincas, que percorriam o país de ponta a ponta, mal viajados, mal hospedados, trabalhando em “teatros” improvisados, ou ocupando belos teatros de verdade, de acordo com a fortuna dos contratos ou das temporadas. Companhias ambulantes a que, na gíria teatral, deu-se o nome simpático de “mambembe”. E hoje ter sido mambembe, em qualquer tempo, é título de glória para todo que se preze.

Adolescente ainda, lembro-me de Lyson em curtas temporadas pelo Ceará; minha mãe e meu pai, teatrômanos fiéis, é que assistiam aos espetáculos: a mim, menina de colégio de freiras, só me permitiam uma ou outra matinê inocente, porque as burletas e farsas de Lyson-Viviani eram consideradas “picantes” para mocinhas… Ela era bonita, tinha voz linda, revolucionava a pequena Fortaleza provinciana de então.

Afinal, já pela década de 40, fui reencontrar aqui no Rio a Companhia Lyson Gaster – com o seu fiel Viviani – fazendo temporada num teatrinho pequeno e simpático, que ficava no subsolo do Teatro Dulcina, na Cinelândia. O estilo era o mesmo, cantava-se, dançava-se, diziam-se piadas, era aquela festa em cena, com Lyson brilhando como sempre, e a gente a aplaudia com o mesmo carinho de anos atrás.

Agora, uma confissão pessoal: foi na Companhia Lyson-Viviani que me inspirei muito quando tive que escrever as heróicas aventuras da “Companhia de Comédias e Burletas Brandini Filho”, para o meu romance “Dôra Doralina. Naturalmente não fiz retratos de tipos. Mas foram as lembranças deles e de outros como eles (a “Brandão Filho”, por exemplo) que me deram o tom, o rítmo, os roteiros, os quadros da vida familiar de uma dessas valentes troupes de mambembe, que entre dificuldades, perigos, credores, más casas, contando apenas o amor e a fidelidade de público, levam em frente o ideal do teatro que trazem no coração.

Lyson Gaster, carinhosa lembrança na memória de todos nós que a aplaudimos, merece as homenagens que sua cidade, Piracicaba, lhe vem prestando, como pessoa e como atriz.”

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