Pedro Alexandrino – o grande seresteiro

Piracicaba é terra de serestas e seresteiros, gente que sabe pontear um violão, uma viola, com grande talento e harmonia. Creio que Pedro Alexandrino pertenceu ao seleto número dos que praticam a arte da seresta, fazendo dela um canto de amor.

Já vai longe o tempo das serenatas ao luar, quando os moços apaixonados brindavam suas amadas, de violão em punho, cantando as valsas sofridas e suspiradas, o peito cheio de amor. Mas os nomes ilustres de cantadores e poetas que passaram por nossas vidas são inesquecíveis e nos vêm à lembrança, ao som das cordas do pinho ao luar…

Pedro Alexandrino morreu em 1991 e me lembro até hoje que foi com grande sentimento e pesar que, na época, tomei conhecimento da sua morte. É que alguns fatos muito bonitos nos ligaram, em forma de singela amizade. Quando de sua partida, Pedro foi alvo de muitas homenagens na imprensa de Piracicaba, tendo sido celebrado justamente pelos amigos queridos, sobretudo os de seresta e violão, o violão que Pedro amou apaixonadamente e dedilhou com maestria.

Poucas vezes nos falamos, Pedro e eu. Mas ele sabia da minha admiração. E nestas mesmas raras oportunidades, o que de mais belo se notava era a humildade do seresteiro, o jeito simples e bondoso pontuando as palavras e seu amor pela música, pela poesia, pela cidade.

Lembro-me de quando o professor Mauro Vianna convidou-me para figurar naquela matéria de bate-papo, do Jornal de Piracicaba, uma página inteira, publicada aos domingos. Mauro fazia um trabalho bonito, meticuloso, detalhado e, ao responder o questionário fornecido pelo colunista, deparei-me com o item “seresteiro”. Eu deveria apontar o nome de alguém que se destacava nas serestas.

Foto: Sônia Márcia Ito/Olhares

Foto: Sônia Márcia Ito/Olhares

Foi então que meu coração balançou. E agora? Com tantos e bons seresteiros em nossa cidade, parecia-me difícil citar apenas um, sem cometer uma grande injustiça com todos os demais nomes consagrados entre nós. Mas, para resolver o impasse, decidi assim: citar o nome de Pedro Alexandrino era uma forma de prestar uma homenagem a toda a classe dos seresteiros piracicabanos.

Sem dúvida, Pedro Alexandrino representava muito bem essa numerosa e unida família que cultiva a belíssima arte da seresta. Assim, dei o meu voto a ele, elegendo-o o seresteiro maior da cidade sem que, com isso, pretendesse colocar em segundo plano os demais nomes que brilhavam – e ainda brilham – na seresta.

 

Ah, não sabem os senhores qual foi a retribuição de Pedro ao meu modesto voto à sua arte! Sabem o que ele fez? Pedro veio brindar-me com uma serenata inesquecível. Como que para agradecer. Não, Pedro! Eu é que fiquei eternamente grata pela música ao luar. Nossa retribuição seria, para sempre, interminável. Eu fazendo elogios, dando meus votos, e você me presenteando com as serestas.

Falamo-nos, depois, ao telefone, onde tive a oportunidade de deixar meus mais calorosos agradecimentos a ele.

Imagino quantas pessoas nesta cidade maravilharam-se com a beleza de sua voz, de seu canto, um canto que soará eterno pela Noiva da Colina, elevando-se de cada pedra solitária, à margem do rio Piracicaba. Uma noiva apaixonada ali estará, à espera do seresteiro que cantou suas belezas como ninguém.

Ao encontro da noiva foi, para sempre, o seresteiro que fez do violão seu instrumento encantado. Este encanto que envolve o cair das tardes piracicabanas. As tardes de Laudelina Cotrin, João Chiarini, Thales de Andrade, Newton de Mello e de tantos outros que amaram as tardinhas caipiras de qualquer outra cidade brasileira. Não importa onde se nasceu, em que cartório, de que cidade, está registrado nosso nome. A importância está, sobretudo, de se pertencer a um lugar. Principalmente, amá-lo.

Tardinhas caipiras, noites enluaradas, plenas de lembranças. Na memória do tempo, o cantor romântico, o seresteiro, o poeta, o homem com a alma de artista que foi cantar para Deus.

Mas, prestem bem atenção. Nas noites de Piracicaba, ao luar, quando tudo dorme, Pedro canta. Se a gente quiser ouvir, a voz de Pedro Alexandrino se ouvirá, sonora e bela. Talvez embalada pelos sinos do Bom Jesus. Em melodia noturna: “Jesus de braços abertos, abençoando a cidade…”.

Pedro Alexandrino partiu há 18 anos, mas continua em nossos corações seresteiros. E os violeiros da terra continuarão cantando para ele. Não será nunca uma valsa de adeus, fúnebre e triste, tampouco uma balada de despedida. Talvez, uma toada melodiosa, regional, de sotaque urbano, porém canavieiro.

E o cheiro doce da cana adoça com perfume a cidade para a qual Pedro cantou sua última seresta.

Autoria: Texto de Marisa Bueloni

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