O AI-5, a censura à imprensa e a reação de O Diário
Bastaram apenas três dias após a promulgação AI-5, em dezembro de 1968, para que o jornal “O Diário”, em Piracicaba, também fosse advertido das novas regras e cobrado de uma auto-censura que deveria ser feita pelos seus próprios diretores e jornalistas.
Adotando uma linha de clara crítica ao governo militar, já no dia 14 de dezembro, “O Diário” abrira a primeira página com a manchete “Fechado o Congresso!”, reproduzindo na íntegra o teor do Ato Institucional que dava ao Presidente da República o direito de fechar também as assembléias e câmaras e cassar os direitos políticos de cidadãos pelo prazo de 10 anos. No dia 15, a manchete continuava crítica ao governo: “Censura à imprensa e prisões marcam novos Atos”, reproduzindo a seguir a lista dos primeiros políticos presos, como o ex-presidente Juscelino Kubitscheck, Darcy Ribeiro,Carlos Heitor Cony, entre vários outros.
No dia 17, o jornal noticiava, também na primeira página, o convite feito aos jornalistas Cecílio Elias Netto e Aloisio Alberto que, acompanhados do delegado Joseph Cella, foram advertidos pelo Cel. Cerqueira Lima, comandante do 5º Gcan, em Campinas, que a decisão do governo era irreversível, que esperava contar com o apoio da imprensa e que não seriam permitidas críticas aos caminhos adotados pela Revolução nem aos seus métodos. Os jornais que não adotassem a auto-censura estariam sujeitos ao fechamento e impedidos de circular.
A notícia terminava registrando: “é com constrangimento que levamos o fato ao conhecimento de nossos leitores, de quem esperamos compreensão para posição que, a partir de hoje, somos obrigados a adotar”. A manchete da primeira página dos quatro dias seguintes referiu-se aos preparativos do homem para sua chegada a lua, o envolvimento de suas esposas no programa espacial, as expectativas dos americanos quanto ao fato.
Dias depois, no entanto, “O Diário” adotou a estratégia de deixar espaços brancos em suas edições, antecipando-se ao protesto depois feito pelo Estadão, com publicação de poemas de Camões, e do Jornal da Tarde, com receitas. A partir desse posicionamento, diretores e redatores de “O Diário” passaram a ser constantemente chamados ao G-Can e os processos se avolumaram, incluindo na Justiça Militar. Essa luta pioneira e solitária daquele jornal e dos jornalistas foi contada por Gustavo Alvim no livro “Um jornal de causas”, de sua tese de doutorado em jornalismo.
A censura só foi suspensa algum tempo depois. O AI-5, durante os dez anos em que vigorou, atingiu 273 mandatos parlamentares, foi acionado 579 vezes, punindo 142 militares, 145 funcionários públicos civis, 102 policiais, 28 funcionários do Poder Judiciário. Foi instrumento para banimento de 80 oposicionistas do regime e para intervenção em 10 municípios.