Os “Anos Dourados” em Piracicaba(4). E o “Café da Manhã” estimula elegância

De repente, o “Café da Manhã”

Nascido em São Joaquim da Barra, Mauro Pereira Vianna passara a adolescência em Orlândia e Pederneiras. Na juventude, como funcionário do Banespa, fizera o curso de Economia em Ribeirão Preto e, depois, o de Direito em Bauru. Prestou concurso e tornou-se funcionário da Receita, sendo inspetor fiscal substituto em Bauru. Naquele cidade, tornou-se conhecido por suas atividades no jornalismo, escrevendo contos para os jornais locais, “Folha do Povo” e “Diário de Bauru”. Seu grande sucesso, no entanto, aconteceu em rádio. Autor e produtor de novelas, diretor de rádio-teatro, Mauro Vianna movimentou a sociedade bauruense com suas produções radialísticas. O programa de maior sucesso era “Conte seu Caso”, onde se narravam histórias de terror, de suspense e de mistério.

Em 1958, Mauro Vianna foi promovido a titular da Inspetoria Fiscal da Receita, transferindo-se para Piracicaba. Já era casado com Maria Lúcia Vianna, e suas três filhas – Ana Cristina, Tânia Maria, Lucinha – tinham nascido em Bauru. ( O quarto filho, Maurinho, nasceria em Piracicaba.) Por alguns meses, Mauro Vianna morou sozinho em Piracicaba, deixando a família em Bauru. Fixou-se em uma casinha na Avenida Armando Salles de Oliveira, de onde via o córrego Itapeva ainda descoberto e a movimentação de Luciano Guidotti para cobri-lo, concluindo a Avenida Armando Salles em direção ao rio Piracicaba.

Mauro Vianna admite ter estranhado a mudança para Piracicaba. E havia motivos. Ainda que cidade menor, Bauru, como grande entroncamento ferroviário, era uma cidade moderna, sem apego a tradições, liderando a expansão paulista pela conquista do Oeste e do Noroeste do Estado. Piracicaba era conservadora, pacata, cultivando seus valores tradicionais. A ebulição estava no ar, com a revolução urbana de Luciano Guidotti. Mas os hábitos, os costumes da Cidade eram fechados, tímidos, alimentados pela permanente pressão do Bispo Ernesto de Paula, conservador e moralista, que renunciaria no final daquela década. O “Jornal de Piracicaba”, também conservador, refletia o pensamento e a filosofia de vida das elites locais, com o prestígio de Losso Neto, um dos líderes do Rotary Club. Por outro lado, o “Diário de Piracicaba” – que, desde 1950, fora modernizado por Sebastião Ferraz – fazia inovações mais audaciosas, ainda que nos limites do conservadorismo local.

Não querendo afastar-se do jornalismo, Mauro Vianna resolveu iniciar a sua atividade em Piracicaba. Ir à redação do “Diário de Piracicaba” foi uma simples coincidência, embora tivesse percebido tratar-se de um jornal com características mais arejadas. Inicialmente, Mauro Vianna pensou em escrever contos, ou revezar-se entre os que escreviam a coluna “Flagrantes”, identificada pelos leitores como sendo de “J.Neto”, na verdade um pseudônimo coletivo, ainda que fosse o prof.Joaquim do Marco quem mais a ocupava com os seus escritos. Em conversa, porém, com Sebastião Ferraz, o diretor do jornal, nasceu a idéia de uma Coluna Social. Ibrahim Sued, com sua coluna no Rio de Janeiro, tinha-se tornado coqueluche nacional. Em São Paulo, Marcelino de Carvalho, Mattos Pacheco, Alik Kostakis e Tavares de Miranda faziam, também, sucesso como colunistas sociais. Por que não em Piracicaba?

No dia 15 de março de 1959, nascia o “Café da Manhã”, a coluna de Mauro Pereira Vianna que assinava com o pseudônimo de Marco Aurélio. O uso de pseudônimo – além de despertar curiosidades, de criar mistérios – fora um cuidado que Mauro Vianna tivera, tentando evitar que se confundissem as suas funções de fiscal de rendas e de jornalista. Mas por que Marco Aurélio? Conta, Mauro Vianna:

– Escolhi o nome Marco Aurélio apenas porque sempre gostei dos nomes da Roma Antiga. E, desde o início, minha intenção foi movimentar a sociedade local, de gente bonita, mas muito fechada. A coluna poderia ser feita com a simples observação das pessoas que freqüentavam o Café Haiti ou que passavam pela “calçadinha-de-ouro”.

Na primeira edição do “Café da Manhã”, naquela dia 15 de março de 1959, Mauro Vianna-Marco Aurélio lançava o desafio:

“Quando elegeremos as dez mais elegantes de Piracicaba? E o melhor partido masculino e feminino, calcado na fortuna “livre e solteira”? (…) Quando conheceremos a garota de mais charme da sociedade piracicabana? Já organizamos a comissão especial de observação auricular e ocular. (…) Alerta! A comissão estará de olho na elegância e simpatia das damas e donzelas de nossa sociedade. Brevemente, haverá notícia.”

A partir dessa coluna, Piracicaba nunca mais foi a mesma. Sem que as pessoas percebessem, incluindo o próprio Mauro Vianna, iniciava-se uma verdadeira revolução nos costumes de Piracicaba. A cidade saía do seu casulo. Viver com requinte, rompendo bastiões morais, criar estilos de vida, abrir salões e “receber”, grandes fortunas de empresários apenas pragmáticos passando a conviver com intelectuais, a arte e a riqueza encontrando-se num mecenato moderno – era o “dandismo”, em sua versão interiorana, acontecendo em Piracicaba. E ninguém sabia.

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