Os “Anos Dourados” em Piracicaba(7): parecendo ou sendo, muitos apareceram

Entre “paraître” e “être”

O “dandismo”, em suas origens, colocou o “paraître” acima do “être”, o parecer sendo mais importante do que o ser, uma certa filosofia de vida. Em Piracicaba, também.No “Café da Manhã”, havia o estímulo para parecer, aparecendo. E uma outra Piracicaba apareceu, provocada por Mauro Vianna, num contexto de transformações. E Piracicaba se fez moderna, pioneira, atuante, audaciosa, atrevida, rompedora de tabus, buscando a síntese entre a “finesse” dos ancestrais e o ímpeto de uma nova classe. Piracicaba, na realidade, deixou de ser para parecer.

Ora, de alguma forma, parecer é, pelo menos, uma busca de ser. Quase 50 anos depois do “Café da Manhã” — daquele transformismo provocado por Mauro Vianna com a bênção de Sebastião Ferraz — os verbos essenciais do “dandismo” hão que provocar indagações. Houve, naqueles anos, um ser em Piracicaba, uma nova Piracicaba? Ou foi um apenas parecer? Piracicaba foi aquilo tudo ou apenas pareceu ser? Que os estudiosos desse tempo possam obter respostas. (Foto: o casal Ermor(Umbelina) Zambello e o casal, jornalista Sebastião(Natalina) Ferraz.)

Pois, quando o “Café da Manhã” deixou de existir e quando se fecharam as mansões piracicabanas, a velha Piracicaba ressurgiu, fechando-se em guetos. Sem ser provocada, Piracicaba retornou ao casulo secular. Lideranças transformadoras calaram-se, morreram ou foram derrotadas nos anos 60. Os mesmos atores e autores daquela grande peça teatral continuaram no palco, mas em outros papéis. O “dandismo” foi vencido, sem ter criado o novo. Novas personagens tentaram repetir o “Café da Manhã”. Mas, na tentativa de repetir-se, a História fez-se tragicômica.

No colunismo social, Mauro Vianna não deixou herdeiros. Teve imitadores. E aquela Piracicaba, sem ter gerado continuadores, deixou de ousar.

Registro de elegância

Estudiosos poderão encontrar, na coluna de Mauro Vianna, um registro detalhado da moda em Piracicaba, de conceitos e de noções de elegância daquele tempo em que muitas famílias — em busca de ascensão social e do “paraître” — faziam despesas maiores do que os seus recursos. O “Café da Manhã” era um registro que, ao mesmo tempo, fornecia informações: quem é quem? Tratava-se, no entanto, do registro de um círculo fechado, de elites, tanto as antigas como as emergentes, que começaram a viver um outro estilo de vida. Isso, obviamente, se era motivo de entusiasmo e euforia para o comércio ligado ao espírito do “dandismo” — repercutindo na própria economia da Cidade — tornava-se, também, um complicador para muitas famílias, engolfadas pelo despertar do “paraître”. Para aquele estilo de vida, havia um custo. E era alto. Mauro Vianna percebeu, de imediato, esse complicador. Maridos e pais tinham razões justificadas para preocupações, pois esposas e filhos passaram a exigir refinamentos que não tinham existido, até então, naquele universo da Piracicaba fechada, conservadora. E o colunista Marco Aurélio — com a experiência do economista e advogado Mauro Vianna, o seu verdadeiro “eu” — batia numa tecla que pretendia ser tranqüilizadora: o que era elegância? E ele próprio tentava defini-la: “elegância não é toalete de elevado custo, mas simpatia, apurada educação, bom gosto e distinção de maneiras.” (Foto: Belinha e Romeu Ítalo Rípoli, casal considerado entre os principais anfitriões de Piracicaba naqueles anos.)

O esforço de Mauro Vianna-Marco Aurélio para dar um sentido racional e também teórico à elegância redundou inútil. Pois, na verdade, o “dandismo” — desde a sua origem nos salões europeus — enfastiava-se do “ser”, optando pelo “parecer”. Em Piracicaba, o fenômeno “dandista” foi o mesmo. Mauro Vianna — há que se olhar com honestidade e senso de justiça para aqueles acontecimentos — tentou mostrar a elegância como exteriorização do “ser”. Mas não conseguiu: Piracicaba havia sido despertada para o cultivo da aparência que, aliás, fôra marca da sua aristocracia rural no Século XIX e no início do XX. As chácaras Morato e Nazareth tinham sido templos daqueles salões de refinamentos. E, mais modernamente, a figura de Jorge Pacheco e Chaves — pai de João, o deputado, e que fôra prefeito de Piracicaba nos anos 40 — era a representação plena do “dândi”. O “Doutor Jorge” — como prefeito e cidadão — tinha a ambição de “civilizar Piracicaba”, como ele dizia. E, por “civilizar”, ele queria dizer “afrancesar”, em seus delírios parisienses. E tanto assim foi que o “Doutor Jorge”, nomeado Prefeito nos tempos de Getúlio, mandou colocar abaixo o jardim da antiga Praça da Matriz — hoje, da Catedral — para que se construísse outra, que ele ambicionava fosse uma pequenina imitação das Tulherias. (Foto: casal Virgílio (Diva) Lopes Fagundes, líderes da comunidade piracicabana.)

Mauro Vianna, despertando o “dandismo”, fez, também, renascer aquela nostalgia de refinamentos. E foi inútil tentar definir, como algo interior, a elegância. Abrindo-se, a Cidade tinha que revelar a sua aparência. Para os estudiosos, o “Café da Manhã” é um registro formidável da concepção de elegância da sociedade piracicabana.

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