Sobre a mãe brasileira de Thomas Mann (3 – final)
Piracicaba – justamente por viver um tempo de pouco respeito à memória – perdeu, ainda outra vez, a oportunidade de mostrar-se aos olhos da Nação como participante de um encontro histórico internacional: a vinda de Fricko Mann, bisneto de Thomas Mann, ao Brasil, na busca de resgatar a história de sua família. Está comprovado que o avô de Thomas Mann viveu em Piracicaba.
Desde o Almanaque de Piracicaba de 1955, Hélio Morato Krahenbuhl tenta contar e valorizar essa história. E, agora, recentemente, com a vinda do bisneto de Thomas Mann ao Brasil, Piracicaba permaneceu calada e indiferente, valendo apenas o esforço de Zuleika Mesquita, responsável pelo Museu do Colégio Piracicabano, no levantamento de informações. A historiadora Marly Therezinha Germano Perecin confirma a existência, nos arquivos do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba, de mapas – de autoria de Archimedes Dutra – em que se refaz o trajeto do rio onde trabalhou Johan Ludwig Hermann Bruhns, pai de Júlia da Silva Bruhns, que, vindo a se casar com Thomas Johan Heirinche Mann, se tornou mãe do imortal Thomas Mann.
O parente piracicabano
Os piracicabanos mais antigos devem lembrar-se de Júlio Bruhns, um homem de grande cultura, ligado a questões esotéricas e com fama de bruxo, que morou em Piracicaba até meados dos anos 60. Júlio Bruhns proclamava o seu parentesco com Thomas Mann, por via de consanguineidade com Johan Bruhns, avô do escritor, que residiu em Piracicaba. Poliglota, Júlio Bruhns fora revisor no jornal O Estado de São Paulo, fato que foi confirmado, ao autor deste comentário, por João Chiarini e Thales de Andrade. Um homem exótico, com uma visão libertária da vida, Júlio Bruhns passou, para seus conterrâneos, apenas como um excêntrico ou um louco. Ele morou, nos últimos anos de sua vida, num cômodo de uma casa antiga na Rua Governador Pedro de Toledo – onde está, hoje, a Casas Bahia – com sua amásia e um cachorro. Morava ao lado da família Aguiar Jorge que residia naquele quarteirão, tendo como vizinho de frente a família Grisolia, do dentista Brás Grisolia.
Júlio Bruns nunca foi levado a sério quando afirmava o seu parentesco com o escritor Thomas Mann.
A confirmação de Júlia
A Editora Ars Poética publicou, recentemente, duas obras definitivas sobre a história de Thomas Mann e sua família. (ver indicação). No livro “Cartas e Esboços Literários”, Júlia Mann, mãe de Thomas Mann, revela a passagem de seu pai por Piracicaba, em correspondência para o outro filho, o também escritor Heinrich. É o seguinte o trecho da correspondência, datada de 20 de janeiro de 1906, de Augsburgo:
“Querido Heinrich. (…) o vovô (Johan Bruhns) juntara-se a cinco senhores no Brasil, cada qual com maior ou menor parte do capital, que foi transformado em ações, com o objetivo de tornar o Rio Tietê navegável. No cargo de diretor, seu avô deveria tornar a coisa realizável. (…) Seu avô conseguiu dinamite através de um colega de negócios. (…) com essa dinamite ele e seus engenheiros suíços puderam explodir as corredeiras do rio, plainando-o de Piracicaba até Lençóis; desse modo, após três anos de trabalho, o primeiro navio (dessa sua companhia) pôde fazer a viagem de ida e volta sem contratempos. Outros barcos a vapor foram construídos, e outros mais encomendados na Suíça. Mas os senhores esperavam que essa companhia lhes desse lucros maiores do que os obtidos. Durante várias viagens nesse rio pouco salutar, seu avô contraiu malária, perdeu então o interesse e demitiu-se do cargo de diretor. Isso aconteceu repentinamente, e logo a seguir eles venderam sua pequena e querida propriedade em Piracicaba e voltaram para a Europa.”
Piracicaba, quando da movimentada visita do bisneto de Thomas Mann ao Brasil – para subsídios ao livro que escreve sobre sua família – não soube participar dessa história, mesmo com o depoimento da mãe de Júlia Mann.
Para entender
Dois livros são fundamentais para se entender a história da família Mann, ambos editados pela Ars Poética Editora Ltda.:
Cartas e Esboços Literários – Júlia Mann, tradução de Claudia Baumgart.
Minhas memórias inescritas – Katia Mann (mulher de Thomas Mann), tradução de Claudia Baumgart.
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