A História que Eu Sei (VIII)

O estilo de administração de Luiz Dias Gonzaga, repetindo as suas passagens anteriores pela Prefeitura, era personalista, inflexível, com mãos de ferro. Luiz Dias Gonzaga nunca aceitou oposição e, no passado, episódios de truculência e agressividade marcaram a sua atuação. Numa dessas vezes, o então proprietário do “Jornal de Piracicaba”, João Franco, precisou armar-se de revólver para enfrentar a violência de Luiz Dias Gonzaga, que se aborrecera com críticas que lhe haviam sido feitas. Outro episódio ocorreu na “Pensão Royal”, na rua Benjamin Constant, onde se situava o meretrício. Em uma briga, houve tiros, Luiz Gonzaga participando, e o alvejado foi um sírio-libanês, Benjamin Zaitung, um “habitué” do local. Aliás, Benjamin Zaitung, galhofeiramente, costumava dizer que a rua Benjamin Constant tinha esse nome em sua homenagem: “Benjamin é constante aqui na zona…”

Porém o mais momentoso dos episódios de violência, envolvendo Luiz Dias, ocorreu com a morte de estudante da primeira faculdade de Odontologia, apelidado de “Capucho”. Tinha acontecido que o panfletista Belmiro Morro Grande houvera escrito um artigo violentíssimo, irritando os estudantes que, no Bar Jaú, fizeram com que Belmiro engolisse, literalmente, o artigo. Saiu grande confusão, Luiz Dias Gonzaga participou, atirou, atingiu “Capucho” que veio a morrer. Processado, Luiz Dias Gonzaga foi absolvido pelo tribunal do júri, numa decisão que levantou suspeitas sobre o promotor público Edgar Vieira Cardoso que deixou passar “in albis” o recurso que se dizia necessário ser remetido ao Tribunal.

Foi esse estilo que Luiz Dias Gonzaga voltou a impor no seu retorno à Prefeitura, como se não percebesse que os tempos eram outros: o esquerdismo era como que moda nacional, mas o Brasil houvera rompido relações diplomáticas com a União Soviética e o Partido Comunista estava proscrito. No início de 1948, eram cassados os mandatos políticos dos filiados ao PCB. Inaugurava-se, com Cicillo Matarazzo, o Museu de Arte Moderna de São Paulo, criava-se o Teatro Brasileiro de Comédia, que viria a se tomar a grande revolução teatral brasileira. Assis Chateaubriand, junto com Pietro Maria Bardi, já tinha instalado o MASP, como que um museu próprio. As famílias deliciavam-se com o liquidificador da Walitta, ouvia-se música nas “electrolas” e “victrolas” da Victor; as meias de “nylon”, o “rayon” eram parte do cotidiano das mulheres. E Luiz Dias Gonzaga mantinha, na Prefeitura, seu estilo personalista, sua mão de ferro, impondo-se sobre a Câmara Municipal de Piracicaba onde a maioria dos vereadores lhe era submissa. A legislação mesma permitia que Gonzaga atuasse com personalismo, pois os vereadores, em caso de ausência na sessão camarária, podiam ser imediatamente substituídos por seus suplentes, bastando-se convocá-los. Foi, por assim dizer, uma Câmara Municipal de alta rotatividade, mas sob controle.

Para se avaliar o controle que Luiz Dias Gonzaga exercia, destaque-se o fato de ele pretender fiscalizar até mesmo a vida pessoal de seus oponentes. Ele e Samuel de Castro Neves, ambos do antigo PRP, haviam-se tomado desafetos políticos, dividindo os correligionários. Luiz Dias Gonzaga, então, para controlar os que estavam a seu favor ou contra, determinou que houvesse como que uma vigília diante da casa de Samuel Neves: na frente da residência do médico, havia a casa de Caetano Provenzano, onde, em uma das dependências, se vendiam passarinhos e gaiolas. Do local, o passarinheiro fazia o controle dos que iam à casa de Samuel Neves para, logo em seguida, dar o relatório a Ambrósio Herling, que o levava a Luiz Dias Gonzaga.

Luiz Dias Gonzaga, administrativamente, foi o responsável pela construção do primeiro trecho asfaltado da Avenida Armando de Salles Oliveira, entre as ruas 15 de Novembro e Prudente de Moraes, facilitando o acesso ao Bairro Alto e Bairro dos Alemães. Construiu, também, estradas na zona rural e foi o comandante da reforma do Estádio do E.C. XV de Novembro, na rua Regente Feijó, quando o ”Nhô Quim” se tornou o primeiro campeão do Interior da Lei do Acesso, em 1948. Estimulou as obras da Catedral, desapropriou o terreno onde se construiu o Colégio Salesiano Dom Bosco.

A obra, porém, que o satisfazia pessoalmente, era o “Mictório Público” que Luiz Gonzaga construiu atrás da Catedral, na Rua 15 de Novembro. Para ele, era um testemunho da modernidade, a ponto de, quando concluído, ir ver o sanitário público, gostando de comentar: “Não parece que estamos na Praça da Sé?!”

*CONTINUA

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