Testamento de Prudente de Moraes é monumento de honradez e dignidade

Entre muitas e respeitáveis personalidades de nossa história, Piracicaba tem um patrono e um paradigma especiais para que, cada vez mais insistentemente, se lute pela dignidade e pela honradez desta terra. É Prudente de Moraes, nem sempre reverenciado com a admiração e respeito que sua vida e obra fizeram por merecer. Até o úlltimos momentos de sua vida, Prudente de Moraes deu testemunho dessa dignidade ímpar e exemplar. Seu testamento é um edificante exemplo de humildade e de decência, num homem que chegou à Presidência da República e dela saiu com a simplicidade dos grandes e com a sua humanidade intacta. Seu depoimento testamentário em favor do filho que teve na mocidade e quando ainda solteiro é um monumento de honradez.

Reproduzido em grafia da época, é o seguinte o texto original do testamento de Prudente de Moraes:

“Testamento do Exmo. Snr. Dr. Prudente José de Moraes Barros, aprrovado por mim tabellião; cosido com cinco pontos de retróz preto e lacrado com cinco pingos de lacre encarnado, de ambos os lados, na forma de estylo, Piracicaba, 20 de Setembro de 1902. O 2º Tabelião, a)Joaquim Antonio de Mattos Junior.

Em nome de Deos. Faço o meu testamento pela forma seguinte:

“Sou natural da cidade de Itú, filho de José Marcellino de Barros e de D.Catharina Maria de Moraes, já fallecidos; – casei-me, em Maio de 1866, segundo o regimen de communhão de bens, com Adelaide de Moraes Barros, filha legítima de Antônio José da Silva Gordo e D. Anna Brandina de Barros Silva.

Do meu casamento tive nove filhos dos quais falleceram em minoridade Maria Thereza e Maria Jovita e vivem os sette seguintes: 1 – Maria Amelia, casada com o Dr. João B. da Silveira Mello. 2 – Gustavo de Moraes, casado. 3 – Julia Prudente, solteira. 4 – Prudente de Moraes, casado. 5- Carlota, casada com o Dr. João Domingues Sampaio. 6 – Antonio Prudente e 7 – Paula de Moraes, solteira.

– Em solteiro, quando ainda estudante, tive um filho natural de nome José, nascido de mulher tambem solteira, o qual veio para a minha companhyia com a idade de tres annos e foi creado e educado como os filhos legítimos, encontrando em minha mulher uma verdadeira mãi. Trateio sempre como filho e usou do meu nome. – José morreu em junho de 1895, na fazenda do Barreiro, victima de um desastre. Estava casado com Gertrudes Pires e deixou tres filhas, Maria, Thereza e Adelaide, das quaes a primeira tinha então quatro annos de idade. Fiz a viuva, que ficou sem recursos, mudar-se com as filhas para esta cidade, onde dei-lhes casa para morar e tenho fornecido os recursos necessarios para a subsistencia e educação das meninas.

– Aquelles sette filhos legitimos e estas tres netas, filhas do meu filho natural – José, cujo reconhecimento ora confirmo – são os meus herdeiros .

– Se houver obstaculo legal a que essas minhas tres netas concorram à herança com os meus filhos legítimos, receberá cada uma, pela minha terça, um legado igual ao quinhão hereditario que lhes caberia, se fossem netas legitimas.

– Minhas filhas Maria Amelia e Carlota receberam, cada uma, por ocasião do casamento, vinte contos de reis em moeda corrente e um piano, – por conta de suas futuras legitimas.

– Meu filho Gustavo recebeu, por conta de suas futuras legitimas, em diversas prestações, a quantia de dezesseis contos duzentos e settenta e cinco mil reis, conforme consta de meus assentos, já descontados Rs. 2:240$000, importancia de uma obrigação de A Fischer e F. Banhard, que liquidou com prejuizo.

Meu filho Prudente recebeu, por occasião de estabellecerse no Rio, a quantia de dois contos e quinhentos mil reis, por conta de suas legitimas. Deixo em minha terça: – à minha filha Julia trinta (30) ações da Companhia Paulista de Vias Ferreas, como uma pequena recompensa aos bons serviços que prestou-me, especialmente em minhas enfermidades, auxiliando sua mãe com muita dedicação.

Ao meu sobrinho e devotado amigo Paulo de Moraes, a quem devo minha gratidão, deixo, como lembrança, a penna de ouro com que assignei a Constituição da Republica a 24 de Fevereiro de 1891 e as tres carabinas.

Deixo dois contos de reis ao asylo de orphãos desta cidade. O que possuo está empregado em predios nesta cidade, em apolices federaes e do Estado de São Paulo, em acções de Companhia e Bancos, em lettras hypothecarias, em uma hyphoteca em São Paulo, e um saldo em conta corrente com o Banco do Comercio e Industria, conforme consta de meus assentos e dos respectivos titulos.

Desejo que a minha sepultura seja assignalada apenas por uma pedra, tendo como inscripção meu nome e as datas do meu nascimento e morte. Nomeio meus testamenteiros: 1 – minha boa e devotada mulher.; 2 – meu filho Prudente, aos quaes confio a execução fiel d’este testamento.

Piracicaba, 20 de Setembro de 1902.

1 comentário

  1. Celso Luiz Antonio Moraes em 17/03/2017 às 23:38

    Um grande homem.

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