JIC Mendes, ilustrador (8)

O texto, a seguir, é conteúdo do livro “JIC Mendes, ilustrador – São Paulo e o mundo há 70 anos nos traços de um grande cartunista”, que integra a Coleção de Humor Gráfico da AHA – Associação dos Amigos do Salão Internacional de Humor de Piracicaba, em parceria com o IHGP – Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba. O livro reúne os trabalhos publicados no jornal “A Noite”, de São Paulo, no final dos anos 40. Conforme nota do editor, as legendas das ilustrações foram transcritas, mantendo-se a grafia original das mesmas.

20 – As “metamorfoses” eleitorais

Quinta-feira, 6 de novembro de 1947

JIC Mendes 20

– Nós, os homens do povo…..

NO EXTREMO oposto ao dos candidatos pés-rapados, os falsos homens do povo, cuja origem abastada é denunciada pelo fraque de gola lamê e pelo empertigado monóculo. O traço do chargista não poupa nem um extremo nem o outro, descendo o sarrafo tanto nas imposturas dos ricos quanto nas insuficiências dos simplórios. Para criticar a hiprocrisia do luxo, lançou mão de habilidade notável no ladrilhado, no brilho da gola e no sombreado quase maquiado do rosto. O prefixo da rádio, claro, é PRK-7 do “cacete” que azucrina os ouvintes.

21 – De saco cheio

Sábado, 8 de novembro de 1947

JIC Mendes 21

Dutra – Ele encheu bem o fardo e agora quem tem que arcar com o peso sou eu!

O PRESIDENTE Dutra carrega nas costas um saco cheio de inflação, crise e carestia – o fardo deixado pelo governo de Getúlio, que, ditador que era, não podia deixar de rir da miséria que causou. Mas o engraçado é que Dutra ascendeu na carreira militar sob as ordens de Getúlio, que o nomeou Ministro da Guerra para recompensá-lo pelo comando da repressão bem-sucedida ao Levante Comunista de 1935. Dutra ocupou o Ministério da Guerra por dez anos e teve participação decisiva na trinca que instaurou a ditadura do Estado Novo em 1937 (ao lado de Getúlio e do general Góis Monteiro). Mesmo depois de participar da queda de Vargas e candidatar-se à presidência em 1945, Dutra recebeu o apoio do próprio Vargas. E findo o governo Dutra, Getúlio assumiu novamente a Presidência. É o que se poderia chamar em política de paradoxo do sabonete: por mais que uma mão lave a outra, ambas continuam sujas.

Como sempre, o detalhe no desenho, desta vez informativo: a corda que fecha o saco leva na ponta uma etiqueta onde se lê “15 anos”, a duração do primeiro período de Vargas no poder (1930 – 1945). “Encheu bem o fardo”, como se terá adivinhado, é um eufemismo.

22 – Davi também torce

Segunda-feira, 10 de novembro de 1947

JIC Mendes 22

Segundo os sampaulinos, isto aconteceu sábado, no Pacaembu…

NEM A réplica da célebre estátua de Michelangelo, postada junto à arquibancada do estádio municipal do Pacaembu, resistiu à emoção do esporte bretão. A vibração com o “GOAL” foi tanta que até a folha de parreira saiu voando, para o maior espanto do torcedor vizinho. A consulta à coleção de “A Noite” mostra que, na década de 1940, o futebol era tão onipresente quanto hoje e que naquela época a grande estrela era o “Diamante Negro” Leônidas da Silva, atacante do São Paulo de 1942 a 1950.

Este desenho foi feito além das três charges semanais e foi o único desenho do JIC a não ser publicado na primeira página, mas na oitava e última página do jornal, que continha então a seção de esportes.

 (continua)

 Para acompanhar outros capítulos deste livro, acesse a TAG JIC Mendes

Deixe uma resposta